Ausência de coerência na petição inicial trabalhista é motivo para extinção do processo sem resolução do mérito

*Daniela Rodrigues de Castro

A petição inicial é o meio pelo qual a parte autora provoca a intervenção jurisdicional do Estado, para que este atue como interventor de uma determinada relação conflituosa.

Na justiça do trabalho, cabe ao reclamante (autor), em sua Reclamatória Trabalhista, indicar os dados essenciais do contrato de trabalho, narrar suas alegações de maneira coerente e suscitar todas as nuances envolvendo o objeto da controvérsia com fito de explicitar seus pedidos de maneira certa e determinada.

Sobre o tema, o doutrinador Carlos Henrique Bezerra Leite, leciona que o pedido, primeiramente, deve ser certo, isto é, expresso, exteriorizado, inconfundível; evitando-se, na inicial, transparecer pedidos tácitos. É, pois, requisito imprescindível do pedido a sua determinação, isto é, ele deve ser definido e delimitado, em sua qualidade e quantidade. O Autor conclui que é preciso, portanto, que o pedido seja expresso, exteriorizado, inconfundível, definido e delimitado para que o juiz possa pronunciar com eficiência e presteza sobre se o pedido é ou não procedente, quando da prolação da sentença. ¹

Importante destacar que o silogismo nas petições inicias, além de permitir a solução mais justa e coerente para o litigio, também visa assegurar princípios basilares do estado democrático de direito, à exemplo do direito ao contraditório e ampla defesa assegurado pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Em outros termos, o direito de defesa não pode ser tolhido ou prejudicado pela má redação das Reclamatórias Trabalhistas.

Nesse contexto, compete ao Magistrado, ao deparar-se com petições confusas, analisar as possíveis consequências daquele texto para o bom andamento do processo, porquanto a lei garante, aos indivíduos pertencentes ao Estado Democrático de Direito, que o processo judicial, para ter validade, deverá atentar-se às legislações e as garantias previstas no ordenamento jurídico pátrio. Sendo certo, pois, que caberá ao Magistrado, em sede de Sentença e Acórdãos, acolher as eventuais preliminares de inépcia suscitadas pelos profissionais jurídicos, em prol da proteção dos princípios já supra indicados.

Vale dizer que, na Justiça do Trabalho, a rigor do §3º do art. 840 da CLT, as reclamatórias trabalhistas que não atendam aos requisitos básicos estampados em lei, deverão ser extintas sem resolução do mérito.

Consigna-se, pois necessário, que a legislação não impõe a redação de petições rebuscadas, com expressões eruditas ou linguagens inacessíveis, mas sim, exige que as informações ali lançadas sejam claras, determinada, coerentes e que os pedidos sejam compatíveis com a narração despendida.

Uma decisão ilustrativa sobre o tema, exarada pelo Juiz da 10ª Vara do Trabalho do Tribunal Regional da 18ª Região, fixou a lição de que “apesar de marcado pela diretriz da instrumentalidade e simplicidade, o direito processual do trabalho não é desprovido de cientificidade, de tal forma que a “breve exposição dos fatos” corresponde à causa de pedir.” ² 

Dessa maneira, conquanto vigore o princípio da informalidade na Justiça Trabalhista, deve o profissional jurídico atender ao silogismo exigido no processo de comunicação, sob pena de confeccionar textos incoerentes e, por consequência, passiveis de inépcias.

À vista do exposto, a parte Reclamante, ao ingressar com ação trabalhista, deve observar – rigorosamente – os requisitos mínimos dispostos em lei, os quais estão devidamente estampados no artigo 840 §1º da CLT, bem como utilizar-se de uma linguagem clara e coerente, em que os pedidos sejam compatíveis com a narração fática, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito.

*Daniela Rodrigues de Castro é advogada trabalhista, Associada do GMPR Advogados S/S.

¹ BEZERRA LEITE, Carlos Henrique. Curso de direito processual do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr

² Processo nº 0011292-28.2020.5.18.0010