A sonegação fiscal e o Direito Tributário

advogado Gustavo SpirandelliO crime de sonegação fiscal, definido no art. 1º da Lei 8.137/90, e o Direito Tributário, guardam uma estreita relação jurídica. É salutar, atentarmos para alguns efeitos legais correlacionados à tipicidade da sonegação fiscal e à seara do direito tributário. Devemos esclarecer dois aspectos sobre o tema em pauta: um diz respeito ao Lançamento Tributário e ao Crédito Tributário, enquanto que, o outro aspecto refere-se à Elisão Fiscal.

Primeiramente, cumpre definir Lançamento Tributário e Crédito Tributário, e posteriormente, conceituarmos o que é a Elisão Fiscal. Pois bem, o Lançamento Tributário é a formalização da obrigação tributária, ou seja, é a efetivação da obrigação tributária por meio de sua liquidez e certeza. O Crédito Tributário por sua vez, é o vínculo jurídico obrigacional, por força do qual o Estado exige do contribuinte ou responsável o pagamento de tributo ou de penalidade pecuniária.

Já a chamada Elisão Fiscal, consiste em um planejamento tributário contextualizado com a ordem econômica constitucional, haja vista que, a elisão não se configura infração à legislação tributária, mas sim, uma forma jurídica, constitucional e legal que propicia ao contribuinte vantagens tributárias e financeiras.

Vejamos, a seguir, o teor do artigo 1º da Lei nº 8.137/90:

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: (Vide Lei nº 9.964, de 10.4.2000)

I – omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;

II – fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;

III – falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;

IV – elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;

V – negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa à venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.

Desta forma, fica caracterizando, explicitamente, que, o referido delito é um crime material ou de resultado. Portanto, em razão da natureza do crime de sonegação fiscal (material ou de resultado), é primordial a ocorrência do lançamento definitivo do tributo para que concretize a condição objetiva de punibilidade ao contribuinte, pois, o crédito tributário, irregularmente constituído, terá uma eficácia inapta e a sua exigibilidade será excluída.

Grande parte das exclusões tributárias ocorre por erro de fato (erro na constituição do crédito), ou seja, por falha na formalização da notificação fiscal ou do auto de lançamento. As irregularidades podem ser afetas às alíquotas ou mesmo à base de cálculo adotada pelo Fisco. Quando estas irregularidades são aferidas, não há que se falar em crime de sonegação, pois, a respectiva autuação carecerá dos elementos objetivos da tipicidade tributária.

Para que se inicie uma Ação Penal Tributária concernente ao crime de sonegação fiscal, é salutar a consumação material do delito, sendo obrigatória, a remessa da notitia criminis (notícia crime) ao Ministério Público, sob pena, de carência da Ação Penal por falta do quesito ‘justa causa’.

O Egrégio Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Habeas Corpus nº 83.901-2, proferiu o seguinte precedente:

HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. DIREITO PENAL TRIBUTÁRIO. CRIME DE RESULTADO. ORDEM CONCEDIDA.

  1. O crime de sonegação fiscal, definido no art. 1º da Lei 8.137/90, somente se consuma com o lançamento definitivo do crédito tributário.
  2. Antes de constituído definitivamente o crédito o crédito tributário não há justa causa para a Ação Penal. Ordem concedida para trancar a Ação Penal em que os pacientes figuram como réus.

Depreende-se, do julgamento alhures esposado, que, a ordem prolatada pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal, resultou em “trancar” a Ação Penal Tributária carecedora de justa causa. Consoante à vertente esposada no respectivo julgado, conclui-se que, na seara de Inquéritos Policiais, não se poderá olvidar a deflagração de prisões ou mesmo remessas de informações ao Ministério Público, quando aferir-se, de plano, a falta de substrato material em procedimentos administrativos do Fisco.

Acima de tudo, é essencial que a conduta de fiscalização tributária, apesar de comportar diretrizes discricionárias, haverá, sempre, que se pautar pelo respeito aos princípios da finalidade da lei, da razoabilidade e da proporcionalidade, sob pena de nulidade das autuações oriundas do respectivo procedimento de fiscalização.

Portanto, o interesse precípuo da legalidade tributária é velar pelo respeito à Constituição e à Legislação Tributária vigente, almejando acima de tudo, a aplicação dos deslindes do direito constitucional tributário em detrimento ao abuso de poder e/ou desvio de finalidade cometido pela Administração em face do contribuinte.

* Gustavo Spirandelli é advogado no Escritório Carraro Advogados Associados S/S; Pós-Graduado em Direito Público (EPD/SP); Especialista CADEMP nas áreas de: Legislação, Licenciamento e Gestão Ambiental (PUC/GO); Direito na Locação de Imóveis e Condomínios (IGDE); Desenvolvimento Gerencial e Empresarial (SENAC); e MBA CADEMP em Estratégias de Comunicação e Marketing (FGV/RJ).