FGV DAPP analisa dados de mortes por armas de fogo nas últimas duas décadas

Relatórios internacionais frequentemente colocam o Brasil no preocupante grupo de países com número recorde de homicídios. O relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2014 apontou o país como primeiro no ranking de homicídios, com o registro de pouco mais de 57 mil no ano de 2012. Utilizando dados mais recentes, de 2015, a ONG mexicana Conselho Cidadão para a Segurança Pública e a Justiça Penal identificou 21 municípios brasileiros dentre as 50 cidades com mais de 300 mil habitantes de maior taxa de homicídio do mundo.

E são nas armas de fogo que temos o principal responsável pela maior parte dos homicídios tanto de homens quanto de mulheres no Brasil. De acordo com os dados do Sistema Único de Saúde (SIM/DATASUS), 56.792 pessoas foram assassinadas no Brasil em 2015; destas, 71% através de armas de fogo. Globalmente, armas de fogo são utilizadas em 41% dos homicídios (UNODC, 2013).

É importante notar a vital importância do Estatuto do Desarmamento para que este número não seja ainda mais grave. Enquanto entre 1997 e 2003 o número absoluto de homicídios por arma de fogo cresceu na média 6,8% ao ano, a partir de 2004, quando a lei entra em vigor, até 2015 (último ano disponível no DATASUS), o crescimento cai para 1,9% ao ano.

Diante desse crítico cenário, na última década, foram adotadas estratégias para conter as mortes violentas no Brasil e as estatísticas dos últimos anos mostram uma certa estabilização da letalidade violenta no país. No entanto, os números recentes deixam escondido um grande desafio a ser enfrentado: a migração das mortes por arma de fogo no país do Sudeste para o Norte e o Nordeste, com quedas vertiginosas em números absolutos no Rio de Janeiro (-49%) e em São Paulo (-42%) de 1996 a 2015 e aumentos significativos em outros estados, como o Maranhão (+706%), o Ceará (+706%) e o Pará (+605%) no mesmo período.

Pode-se notar que o Norte embora represente em números absolutos uma porcentagem pequena, apresenta forte crescimento nos 19 anos analisados, quando levado em conta o tamanho da população: em 1997, a região registrava 10,61 mortes por arma de fogo para cada 100 mil habitantes contra uma taxa de 26,36 em 2015. O salto fez com que o Norte saísse da menor taxa por região do país para a segunda maior, atrás apenas do Nordeste. Já o Nordeste passou de uma taxa de 14,78 mortes de arma de fogo para cada 100 mil habitantes em 1997 para 33,61 em 2015. Já o Sudeste viu sua taxa cair de 21,43 para 13,05 em quase duas décadas — passando do topo para o final do ranking.

Ao analisar os dados absolutos de mortes por arma de fogo dos dois últimos anos disponíveis, já se pode constatar um aumento significativo em nove estados, sendo quatro no Norte do país. O estado do Amazonas é um deles, passando de uma alta de 9%, entre 2013 e 2014, para 22%, entre 2014 e 2015. Tocantins, por sua vez, foi o estado que registrou o maior aumento de homicídios por armas de fogo entre 2014 e 2015: 56% contra 13% de crescimento no biênio anterior. Roraima e Pará tiveram alta de 29% e 7%, respectivamente, no último ano da série.

Rio Grande do Sul e Santa Catarina registraram alta de 9% e 13%, respectivamente, entre 2014 e 2015, nas mortes por armas de fogo. Por outro lado, os dados apontam para tendência significativa de queda em todos os estados da região Sudeste: Minas Gerais (-4%), Espírito Santo (-14%), Rio de Janeiro (-13%) e São Paulo (-12%). O Distrito Federal foi a unidade da federação que apresentou a maior redução de mortes por arma de fogo no período: -24%.

As mortes por arma de fogo são extremamente desiguais também no que se refere às vítimas: em 2013, 94% foram homens, 58% jovens entre 15 e 29 anos e 68% negros (que inclui pretos e pardos). Vale ressaltar que, segundo a projeção populacional do IBGE, a população brasileira no ano de 2013 era composta por 50,6% de homens, 25,7% de jovens entre 15 e 29 anos e 51% de negros.

Confira a íntegra do estudo aqui