Embriaguez x delito no Brasil

Jenifer Moraes*

Diferentemente do Código Penal espanhol, que dispõe em seu artigo 20 que está isento de responsabilidade criminal quem “no momento da prática do crime se encontrar em estado de plena embriaguez devido ao consumo de bebidas alcoólicas, drogas tóxicas, substâncias psicotrópicas, desde que não tenha buscado o cometimento da infração ou que seu cometimento tenha ou deveria ter sido previsto”, o Brasil possui um tratamento mais rigoroso em relação ao tema.

O nosso Código Penal prevê expressamente em seu artigo 28, inciso III que a embriaguez, voluntária ou culposa, não exclui a imputabilidade, sendo isento de pena somente o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

A embriaguez fortuita caracteriza-se por não ser consequência da conduta consciente do agente, ou seja, ele não quis se embriagar, não tinha previsibilidade da possibilidade de se embriagar ou sequer queria ingerir a substância. Se essa embriaguez apenas reduz a capacidade do agente, por outro lado, ele terá sua pena reduzida de um a dois terços.

Assim, para a nossa legislação, tanto a chamada embriaguez culposa (em que o agente opta por ingerir a substância, mas não tinha o objetivo inicial de se embriagar) quanto a chamada embriaguez voluntária (em que o agente queria inicialmente se embriagar e ingere a substância para isso) não diminuem automaticamente pena de quem pratica o crime.

Esse tratamento também é admitido em relação a pessoas que estão em um estágio avançado de embriaguez, porque no Brasil adota-se uma teoria que transfere o momento de consideração da responsabilidade para o momento anterior à prática da conduta criminosa, quando se podia prever o resultado. No caso concreto, portanto, o juiz apenas identificará se a pessoa embriagada cometeu um crime de forma dolosa ou culposa.

Por fim, nosso Código Penal prevê como agravante (Art. 61, II, L) a chamada embriaguez preordenada, ou seja, aquela em que o agente ingere a substância com a finalidade de cometer o crime (por exemplo, para dar coragem) e nesses casos, não só a pessoa será responsabilizada de forma dolosa, como terá sua pena aumentada.

O mais importante, em todos os casos, é diferenciar a vontade do agente em relação à substância e à embriaguez, da vontade em relação ao cometimento do delito. Uma pessoa se embriagar voluntariamente e, já estando embriagada, cometer um delito de forma culposa, por exemplo.

*Jenifer Moraes é professora de Direito Penal e Direito Penal Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie, campus Campinas.