TJGO suspende liminar de reintegração de posse que afeta 300 famílias na Região Oeste de Goiânia

A 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) acolheu, nesta segunda-feira (08/04), agravo de instrumento interposto pela Defensoria Pública do Estado de Goiás (DPE-GO) e determinou a suspensão da liminar de reintegração de posse que afetaria mais de 300 famílias residentes em ocupações localizadas no Residencial Solar Ville, em Goiânia. A decisão anula os efeitos da liminar anteriormente concedida e atinge diretamente as ocupações Marielle Franco, Manaim, Terra Prometida, Zumbi dos Palmares e Paulo Freire (esta última, parcialmente).

O relator do recurso, desembargador Jeronymo Pedro Villas Boas, destacou que não foram observadas etapas processuais essenciais, como a realização de audiência de mediação antes da concessão da medida liminar. O magistrado também reconheceu a necessidade de intimação prévia da Defensoria Pública, por atuar como representante legal das pessoas em situação de vulnerabilidade.

Segundo o defensor público Gustavo Alves de Jesus, subcoordenador de Questões Fundiárias e Urbanísticas do Núcleo Especializado de Direitos Humanos (NUDH/DPE-GO), a ausência da audiência de mediação compromete a legalidade do processo. “A ausência de designação de audiência de mediação antes de concessão de liminar em face de dezenas de famílias vulneráveis exclui etapa crucial do processo judicial cível, segundo as normas do Código de Processo Civil e de convenções internacionais das quais o Brasil é signatário, reduzindo a possibilidade de efetiva solução do litígio que, normalmente, se apresenta como demanda por política pública habitacional ou de reforma agrária”, afirmou.

Ainda conforme o defensor, não houve a devida intimação da DPE-GO para manifestação antes da análise da liminar. “Ao atuar como guardiã dos interesses dos grupos vulneráveis, a Defensoria Pública não deve agir como mero agente legitimador dos atos processuais praticados, devendo exercer sua obrigação constitucional de defesa dos direitos humanos, o que só é possível se lhe é facultado o acesso à demanda antes da análise da liminar”, completou.

Atuação no STF

Paralelamente à decisão do TJGO, a DPE-GO também ajuizou Reclamação Constitucional com pedido liminar no Supremo Tribunal Federal (STF), com o objetivo de assegurar os direitos das famílias afetadas. No pedido, a instituição requer a realização de audiência pública ou reunião preparatória com a presença de representantes legais e a determinação para que o Município de Goiânia e o Estado de Goiás indiquem local de realocação das famílias, além de providenciarem o encaminhamento dessas pessoas aos órgãos de assistência social e programas habitacionais.

Contexto da ocupação

A ocupação teve início em área pertencente ao Município de Goiânia. Contudo, segundo a DPE-GO, as famílias foram removidas do local sem decisão judicial, contraditório ou respeito às normas nacionais e internacionais sobre remoções forçadas.

Diante da ausência de alternativa habitacional e em situação de desabrigo, os ocupantes se deslocaram para área próxima — o Residencial Solar Ville —, que, conforme relatos, estaria desocupada há cerca de 25 anos. Durante a pandemia de Covid-19, o número de famílias em situação de vulnerabilidade aumentou, intensificando a busca por moradias em áreas desocupadas, tanto públicas quanto privadas.

Atualmente, há ao menos cinco ocupações identificadas no Solar Ville: Paulo Freire, Zumbi dos Palmares, Marielle Franco, Terra Prometida e Solar Ville. Parte dessas áreas é pública e outra, privada, conforme apuração do Proad nº 202301000378149, da Comissão de Soluções Fundiárias do TJGO.

A decisão de primeira instância que concedeu a liminar de reintegração de posse foi proferida em 19 de fevereiro, com expedição imediata do mandado. Os moradores foram intimados em 2 de abril, sem que a Defensoria Pública ou o Ministério Público tivessem sido previamente notificados, em desacordo com o artigo 554 do Código de Processo Civil, com a ADPF 828 do STF e com as diretrizes da própria Comissão de Soluções Fundiárias do TJGO. Com informações da DPE-GO