STJ reconhece que cooperativas não entram na RJ dos cooperados; para advogado, julgamento reforça segurança jurídica

Por decisão unânime, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que os créditos oriundos de contratos firmados entre cooperativas e seus associados não se submetem à recuperação judicial. O entendimento, que reconhece esses contratos como atos cooperativos, foi firmado no julgamento de dois recursos especiais sob relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.

A decisão tem repercussão relevante para o setor cooperativista, sobretudo o agropecuário, ao consolidar que operações financeiras entre cooperativas e seus cooperados mantêm natureza jurídica própria — distinta de relações típicas do mercado bancário. Com isso, esses créditos são classificados como extraconcursais, ou seja, não entram na lista de dívidas a serem negociadas ou suspensas no processo de recuperação.

Para o advogado Murilo Falone, especialista em direito cooperativo, a decisão representa um marco importante na busca por maior segurança jurídica no setor. “Esse acórdão do STJ, embora tenha sido sobre cooperativas de crédito, tem reflexo direto nas cooperativas agropecuárias. A gente vinha sofrendo muito com a inclusão indevida de créditos em processos de recuperação judicial, o que compromete totalmente o fluxo de caixa da cooperativa”, afirmou.

Segundo Falone, a natureza do vínculo entre cooperado e cooperativa é distinta da lógica empresarial tradicional. “O dinheiro que, muitas vezes, juízes colocam na planilha de recuperação judicial pertence aos cooperados, não apenas à cooperativa. Isso pode levar a uma quebra injusta de um sistema que é coletivo e democrático por essência”, defendeu.

Ele destaca ainda que a decisão do STJ contribui para um ambiente mais seguro para investimentos e ampliação do número de cooperados. “Precisamos de segurança jurídica para continuar fomentando nossos cooperados, principalmente em operações de alto valor, como compras de insumos agrícolas. Essa definição do STJ fortalece o cooperativismo como modelo sustentável e confiável”, concluiu.

Casos julgados

Nos casos julgados, empresas em recuperação judicial buscavam incluir os valores devidos às cooperativas no processo recuperacional, argumentando que as operações tinham caráter mercantil e não poderiam ser consideradas atos cooperativos. Também questionavam a validade do §13 do artigo 6º da Lei de Recuperação Judicial (Lei 11.101/05), incluído pela reforma de 2020, que expressamente exclui os atos cooperativos dos efeitos da recuperação.

O STJ, no entanto, manteve a interpretação já adotada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP), ao reconhecer que a concessão de crédito integra os objetivos sociais da cooperativa e se encaixa no conceito legal de ato cooperativo previsto na Lei 5.764/71. “O ato de concessão de crédito realizado entre a cooperativa de crédito e seu associado está dentro dos objetivos sociais da cooperativa, devendo ser considerado como ato cooperativo e, portanto, não sujeito aos efeitos da recuperação judicial”, afirmou o ministro Ricardo Cueva.

Com esse novo entendimento consolidado no STJ, conforme o advogado, as cooperativas ganham respaldo para continuar operando com maior previsibilidade jurídica, protegendo sua estrutura e os interesses dos milhares de cooperados que delas dependem.