STJ absolve homem de Goiás que confessou homicídio para proteger a então companheira, que foi quem cometeu o crime

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O ministro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), julgou procedente revisão criminal para absolver um réu de Goiás condenado pelo Tribunal do Júri a 12 de reclusão por homicídio ocorrido em janeiro de 2014, no Setor Parque das Flores, em Goiânia. O magistrado levou em consideração nova prova apresentada após o trânsito em julgado da ação. No caso, a ex-companheira do acusado confessou, em procedimento de justificação, ter sido a autora do crime, informação que foi confirmada por outras duas testemunhas, sendo uma delas, inclusive, a filha do ex-casal. O homem ficou preso por três meses. Ele foi solto na segunda-feira (18).

O advogado Tadeu Bastos, sócio da banca MRTB Advogados e que representa o réu, ingressou com recurso no STJ após o Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), por maioria de votos, indeferir revisão criminal. O argumento para a negativa foi o de que a nova prova não possuía o potencial desconstitutivo necessário. Mantendo, assim, a decisão condenatória do Conselho de Sentença. Na ocasião, diante da existência de um voto divergente, a defesa interpôs Recurso Especial e Extraordinário, os quais tiveram seguimento negado.

No recurso ao STJ, o advogado esclareceu sobre a revelação da mulher, corroborada pelo depoimento de outras duas testemunhas que não foram ouvidas na instrução criminal. Relatou que o réu somente confessou a autoria delitiva durante a ação penal para poupar a então companheira e a filha adolescente, por acreditar que esse seria o melhor caminho para sua família. Subsidiariamente, argumentou que o acórdão do TJGO teria se omitido sobre as teses defensivas, sendo assim nulo por negativa de prestação jurisdicional.

Conjunto probatório incompleto

Ao analisar o recurso, o ministro apontou que o conjunto probatório que ensejou a condenação foi incompleto, pois negligenciou a ouvida de duas testemunhas imprescindíveis à compreensão dos fatos pelo júri. Salientou que a omissão da acusação em colher as sobreditas provas, essenciais para a corroboração de sua hipótese, configura perda da chance probatória e, por si só, já coloca em xeque os fundamentos da condenação.

O ministro ressaltou que, com o resultado da justificação, relatado pelo próprio acórdão do TJGO, o único e frágil elemento que sobrou para sustentar a condenação foi a confissão qualificada do réu, que se revelou ser inverídica e motivada unicamente pelo desejo de resguardar sua família.

Salientou, ainda, que as instâncias ordinárias incorreram numa dupla omissão valorativa: a primeira, em não dar a menor atenção aos novos depoimentos, favoráveis ao acusado, desprezando-os de plano; e a segunda, em desconsiderar o interesse da ex-companheira do réu, quando testemunhou no curso da ação penal. Tudo isso se soma à omissão do MP em formar um acervo probatório efetivamente completo.

Disse que, no acórdão do TJGO, não foi dada nenhuma explicação para o motivo de os novos depoimentos não terem “o condão de excepcionar a coisa julgada”. “Esse tipo de análise superficial da prova, que desconsidera de antemão os dados probatórios favoráveis ao réu e não se aprofunda sobre os interesses e possíveis vieses das testemunhas, não é aceita pelo STJ para manter uma condenação em sede de revisão criminal”, explicou o ministro.

Depoimentos indiretos

O ministro citou, ainda, o voto vencido no julgamento do TJGO, que percebeu outra peculiaridade da causa: os depoimentos apresentados ao júri foram indiretos, pois nenhuma das outras testemunhas então ouvidas presenciou os fatos, tendo elas relatado somente o que ouviram dizer quando da falsa confissão. Neste sentido, observou que o testemunho indireto é inservível para fundamentar a condenação, inclusive no âmbito do tribunal do júri. Do mesmo modo, o parecer do MPF notou as graves inconsistências no acórdão recorrido e sugeriu o provimento do recurso.

Leia aqui o acórdão.

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 2439687 – GO (2023/0301190-9)