STF reafirma prerrogativa do MP na condução de investigações e determina diligências em caso de estupro

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A partir de recurso extraordinário com agravo (nº 1545340) interposto pelo Ministério Público de Goiás (MPGO), o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu as prerrogativas constitucionais da instituição na condução de investigações criminais, especialmente em casos de violência sexual contra mulheres. A decisão foi proferida pelo ministro Cristiano Zanin, em 28 de maio de 2025.

O caso envolveu investigação complexa sobre crime de estupro, na qual o inquérito foi remetido ao MPGO seis anos após sua instauração, ainda com informações insuficientes para a formação da opinio delicti (opinião sobre o delito). O MP formulou sete requerimentos de diligências complementares que não foram atendidos adequadamente, tendo o magistrado determinado o arquivamento do inquérito policial de ofício sob o fundamento de que houve violação á duração razoável do processo.

Diante da violação, o Ministério Público interpôs apelação, por meio da promotora de Justiça Renata Caroliny Ribeiro e Silva, para defender as atribuições do Ministério Público, uma vez que o arquivamento do inquérito policial depende de requerimento expresso do órgão de acusação, por ser o titular da ação penal. No entanto, a 3ª Câmara Criminal do TJGO não proveu o recurso.

Inconformado, o MPGO interpôs recurso extraordinário com agravo, assinado pela promotora de Justiça Yashmin Crispim Baiocchi de Paula e Toledo, junto ao Supremo Tribunal Federal (STF).

De acordo com o que foi sustentado pelo MPGO no recurso extraordinário, o Tribunal de Justiça do de Goiás (TJGO) violou as atribuições constitucionais do Ministério Público ao determinar o arquivamento de ofício de um inquérito policial que investigava um crime de estupro, sem requerimento ou concordância da instituição. A decisão do tribunal goiano contrariou o artigo 129, inciso I, da Constituição Federal, que confere ao Ministério Público a titularidade exclusiva da ação penal pública.

O Ministério Público Federal emitiu parecer favorável ao MPGO no qual afirma que a demora injustificada na apuração de infrações penais, em especial em relação à prática de crime sexual contra mulher, viola convenções internacionais das quais o Brasil é signatário. Entre elas estão a Convenção Americana de Direitos Humanos e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher.

Ao analisar o caso, o ministro Cristiano Zanin destacou que, embora a jurisprudência do STF admita o trancamento de inquérito de ofício em hipóteses excepcionais de flagrante ilegalidade, as particularidades do caso – a natureza do crime investigado e a deficiência no cumprimento das diligências investigatórias – impedem o reconhecimento de situação que justifique o encerramento das investigações sem manifestação ministerial.

A decisão aponta que nos casos de violência sexual, “a responsabilidade dos órgãos públicos em reportar e investigar os atos lesivos tem especial relevância, uma vez que, além do medo de represália e da necessidade de identificação dos infratores, há dificuldades até mesmo para identificar as situações de violência e conseguir reportá-las. A investigação deve ser, por isso mesmo, a mais diligente e ampla possível”.

Diante disso, o STF deu provimento parcial ao recurso extraordinário para determinar o prazo de seis meses para a realização das diligências, com o objetivo de munir o MPGO das informações necessárias à formação da opinio delicti, sob pena de responsabilização das autoridades competentes.

Atuou em segundo grau pelo MPGO o procurador de Justiça Abrão Amisy Neto.