Socioafetividade é suficiente para ensejar prestação de alimentos, entende juiz de Aparecida de Goiânia

O juiz Ricardo de Guimarães e Souza, da 1ª Vara de Família e Sucessões de Aparecida de Goiânia, manteve o registro de nascimento de uma menor bem como a obrigação de alimentos estipulada por pai socioafetivo. Ele havia requerido a desconstituição da paternidade, diante da comprovação da ausência de vínculo biológico com a menina, tempos depois de tê-la registrado como filha.

Na ação negatória de paternidade c/c anulação de registro civil e exoneração de alimentos, o homem sustentou que registrou espontaneamente a menor em 2012, acreditando ser seu pai. E que passou a desconfiar da paternidade, razão pela qual realizou exame de DNA, no qual foi constatada a ausência de vínculo biológico. Segundo ele, após este resultado, separou da mãe da criança e que não manteve mais contato com a menina.

Ao analisar o caso, contudo, o magistrado observou que o registro da paternidade somente poderá ser desconstituído mediante a comprovação do erro, coação ou simulação que viciem a vontade do pai registral. Não podendo, por mera liberdade, ser desconstituída a periadenite que foi livre e voluntariamente reconhecida. “Assim, cabe ao pai registral o ônus da prova de que foi induzido em erro, ou que houve qualquer outro vício de consentimento, quando do registro da paternidade, não bastando para desconstituir o registro a comprovação de inexistência de vínculo biológico, ou mesmo o arrependimento posterior”, afirmou.

Vínculo socioafetivo

Segundo salientou, embora não exista o vínculo biológico entre pai e filha, restou constatada nos autos a existência de vínculo socioafetivo, conforme disciplina o art.1.593 do Código Civil. “O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”, sendo parentesco civil todo aquele que não tem origem biológica. Para ele, o vínculo socioafetivo entre o pai registral e a menor é privilegiado em detrimento do vínculo biológico, sendo este o entendimento da jurisprudência e doutrina. “É dizer, havendo o vínculo socioafetivo, o biológico é de somenos importância”, pontuou.

O magistrado mencionou que o homem não conseguiu demonstrar nos autos a existência de vício de consentimento, erro ou falsidade no momento do registro de nascimento da criança. E que ainda ficou constatado que nunca deixou de se comportar como pai, até mesmo após ter proposto esta ação, em maio de 2017, e ter se comprometido em juízo a lhe pagar alimentos quando se divorciou de sua mulher.

Sempre em contato

O magistrado citou ainda relatório técnico elaborado em dezembro de 2020 pela equipe interprofissional da unidade judiciária e não impugnado pelo autor. Foi constatado que ele nunca deixou de ter contato com a criança, e “manteve genuíno relacionamento de pai e filha” e que sempre foi um pai presente na vida da menor, havendo afeto entre ambos até os dias atuais.

Em seu favor, o homem disse que pode continuar ajudando a menina espontaneamente, sem a obrigação judicial, vez que ela tem um pai biológico, e que não pretende se afastar dela. Por sua vez, a menina sempre se refere a ele como pai, afirmando que “ele é legal”, e que vai sempre à sua casa, quando “ajudo minha tia, brinco de pique-esconde, pega-pega, brinco com o cachorro Shelp”. Também contou que muitas vezes vão passear no shopping, na praça e comem pizza.

Para o juiz, o homem pretende tão somente desvencilhar da obrigação de alimentar, sem encerrar a convivência paternal, que foi buscada por ele de forma espontânea e consolidada ao longo do tempo. “Assim, em um mundo de relações afetivas cada vez mais efêmeras e com aspecto de descartabilidade, cabe ao Judiciário amparar os interesses dos incapazes, preservando sua dignidade e seu direito personalíssimo à filiação”, ponderou o magistrado. Com informações do TJGO