A reversão do regime híbrido ao trabalho presencial: aspectos jurídicos e recomendações práticas

Com a estabilização do cenário pós-pandemia, muitas empresas têm promovido a volta ao trabalho presencial integral. Na coluna desta terça-feira (6), o advogado Arcênio Rodrigues da Silva analisa a viabilidade jurídica dessa mudança, os cuidados exigidos pela legislação e as estratégias recomendadas para uma transição segura e alinhada aos direitos dos trabalhadores. Leitura essencial para gestores e profissionais de RH. Ele sócio do Rodrigues Silva Sociedade de Advogados, mestre em Direito Tributário, com especializações em Direito Público e Direito Tributário, além de administrador de empresas com pós-graduação em Controladoria.

Arcênio Rodrigues da Silva

Leia a íntegra do  texto:

Durante a pandemia de Covid-19, a adoção do regime híbrido de trabalho representou uma solução estratégica para assegurar a continuidade das atividades empresariais em um contexto de restrições sanitárias. Embora o teletrabalho já estivesse regulamentado pela Reforma Trabalhista de 2017, foi a necessidade de distanciamento social que impulsionou a consolidação de modelos mais flexíveis. Com a atual estabilização do cenário epidemiológico, diversas organizações têm promovido a retomada do trabalho presencial integral. Nesse contexto, compartilho algumas reflexões jurídicas sobre a viabilidade e os cuidados necessários para a efetivação dessa transição de maneira segura e conforme a legislação vigente.

Do ponto de vista jurídico, a reversão do regime híbrido para o presencial é plenamente admissível. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), ao disciplinar a reversibilidade do teletrabalho, oferece fundamentos que, por analogia, se aplicam também ao regime híbrido. A legislação e a jurisprudência reconhecem o poder diretivo do empregador para organizar a atividade empresarial, desde que o exercício desse poder respeite a boa-fé, a função social do contrato e não resulte em prejuízo relevante ao trabalhador. Casos recentes reforçam a legitimidade da medida quando lastreada em fundamentos organizacionais e operacionais.

A implementação da mudança exige, contudo, a observância de requisitos formais imprescindíveis. A comunicação prévia aos empregados deve ser realizada com antecedência razoável, de modo a permitir a reorganização pessoal e familiar dos trabalhadores. Recomenda-se, ainda, a celebração de aditivo contratual, formalizando a alteração e resguardando a segurança jurídica da nova condição de trabalho. É essencial assegurar que a alteração contratual não configure violação do artigo 468 da CLT, que veda mudanças unilaterais prejudiciais ao empregado.

Outro aspecto a ser considerado é o restabelecimento do controle de jornada. Em regime de teletrabalho, muitos empregados estavam dispensados do registro de ponto. Com o retorno ao presencial, é obrigatório implementar sistemas de controle compatíveis com a legislação, como registros manuais, mecânicos ou eletrônicos, nos termos das normas regulamentadoras aplicáveis.

Apesar da viabilidade jurídica da medida, é importante atentar-se para potenciais riscos, tais como ações judiciais individuais ou coletivas alegando alteração contratual lesiva. Tais riscos se tornam mais evidentes caso o retorno imponha custos significativos ou impacte de maneira negativa a condição laboral dos empregados. Para mitigá-los, é recomendável adotar medidas como a manutenção de um diálogo transparente com os colaboradores, a previsão de um período de transição gradual e a revisão das políticas internas para alinhamento com a nova realidade.

A reversão do regime híbrido para o presencial integral é juridicamente possível e, em muitos casos, estrategicamente desejável para a integração das equipes e o fortalecimento da cultura organizacional. Todavia, o sucesso desta transição depende da observância rigorosa dos requisitos legais, da comunicação clara e da construção de um ambiente de respeito às necessidades dos trabalhadores. A atuação preventiva e estratégica, amparada por assessoria jurídica especializada, é o melhor caminho para garantir a segurança jurídica e a estabilidade das relações de trabalho.