“A participação do empregado no custeio do auxílio-alimentação e de outras verbas similares descaracteriza sua natureza salarial, independentemente do valor deduzido a este título da respectiva remuneração, por se tratar de circunstância incompatível com a finalidade contraprestativa atribuída a tal parcela antes da vigência da Lei 13.467/2017”. Esse foi o entendimento firmado, por unanimidade, pelo Plenário do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (Goiás) ao apreciar o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) 10195-28.2017.
Este incidente foi instaurado em agosto de 2017, pelo Plenário do TRT18, após a apreciação de Recurso Ordinário encaminhado pelo Juízo de Valparaíso com o objetivo de firmar precedente obrigatório a ser observado no julgamento de ações em trâmite neste Regional que versem sobre a natureza jurídica do auxílio-alimentação quando há participação do empregado no seu custeio.
Em um primeiro momento em seu voto, o presidente do tribunal, desembargador Platon Teixeira Filho, delimitou a temporalidade das normas acerca do auxílio-alimentação. Ele ressaltou que antes da reforma trabalhista, o princípio era de que a alimentação fornecida em função do contrato de trabalho constituia salário-utilidade para todos os fins, “sendo essa diretriz insculpida na Súmula 241 do TST, a qual ainda não foi modificada ou cancelada”. No entanto, o conceito do auxílio mudou após a reforma trabalhista, conforme salientou o desembargador. De acordo com o parágrafo 2º do artigo 457 da CLT, as importâncias pagas a título de auxílio-alimentação não integram a remuneração do empregado, não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência para qualquer encargo trabalhista e previdenciário.
Em seguida, Platon Filho observou a existência de descontos salariais relativos à cobrança de parte do valor da utilidade, constatada em inúmeros processos instaurados sob a constância do quadro normativo pretérito, e que esta demanda teria gerado duas correntes interpretativas no TRT18 sobre a natureza do auxílio-alimentação.
A primeira corrente, de acordo com o desembargador, adota o entendimento de que a ausência de onerosidade para o empregado constituiria premissa indispensável à configuração de sua natureza contraprestativa, na medida em que os descontos evidenciariam a finalidade indenizatória da parcela. A segunda corrente, considera que a circustância do trabalhador arcar com parte do valor do benefício por si, não teria o condão de produzir esse efeito.
O presidente entendeu que seria necessário verificar, na hipótese examinada, a inexistência de condições lesivas ao trabalhador e de condicionamento ou impedimento à livre expressão da sua vontade, sendo razoável considerar que a ausência de tais vícios pode ser pressuposta quando os ajustes convencionados no contrato de trabalho sejam efetivamente proveitosos para o empregado. “Sob essa perspectiva, a onerosidade bilateral do auxílio-alimentação e de outras verbas congêneres revela a presença de um pacto adjeto ao contrato de trabalho, mediante o qual empregado e empregador distribuem entre si o ônus do custeio da utilidade, sem vinculá-la à remuneração por serviços prestados ou pelo tempo em que o primeiro permanece à disposição do segundo, tendo como corolário o desvirtuamento da sua índole retributiva”, considerou o desembargador.
O fundamento, sustentou o presidente, estaria na premissa de que só as utilidades fornecidas gratuitamente podem ser tidas como contrapartida salarial, sendo inconcebível admitir que o empregado tenha que despender qualquer importância como pré-requisito para o recebimento da contraprestação derivada do trabalho desempenhado em favor do empregador ou da alienação a este da disponibilidade de parte do seu tempo. Platon Teixeira Filho ainda trouxe a consolidada jurisprudência do TST no sentido de descaracterização da natureza salarial do vale-alimentação quando o empregado contribui, em qualquer medida, para o custeio do benefício.
O presidente afirmou que, embora seja dever dos tribunais manter estabilidade de sua jurisprudência, não seria útil ou razoável a adoção de teses contrapostas às prevalecentes nas Cortes Superiores. “Isso não apenas pela virtual possibilidade de que o precedente firmado seja objeto de recurso para essas instâncias revisoras, mas sobretudo porque a estabilidade, integridade e coerência da interpretação e aplicação do direito positivo exige que os órgãos jurisdicionais observem a necessária disciplina judiciária, propiciando aos jurisdicionados segurança e previsibilidade no julgamento de lides similares”, considerou o desembargador.
Assim, o presidente concluiu seu voto no IRDR no sentido de consubstanciar a tese jurídica obrigatória para que os processos em trâmite e ações futuras no TRT18 observem que “a participação do empregado no custeio do auxílio-alimentação e de outras verbas similares descaracteriza sua natureza salarial, independentemente do valor deduzido a este título da respectiva remuneração, por se tratar de circunstância incompatível com a finalidade contraprestativa atribuída a tal parcela antes da vigência da Lei 13.467/2017.”.