O Ministério Público Federal (MPF) em Goiás interpôs agravo de instrumento (com pedido de antecipação de tutela de evidência) para que o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) reforme decisão interlocutória proferida nos autos no 1005393-98.2017.4.01.3500, da 6ª Vara Federal de Goiás. O juízo de primeiro grau indeferiu o pleito liminar antecipatório requerido em Ação Civil Pública (ACP) ajuizada pelo MPF no final do ano passado. O objetivo da ACP era proibir a União de utilizar regulamentações ilegais para comprovação à autoridade policial da necessidade de aquisição e registro de arma de fogo.
Para o procurador da República Ailton Benedito houve uma disparidade do juízo original ao indeferir o pedido liminar antecipatório da tutela de evidência na ACP, por meio de justificativas que não guardam relação com o que fora pedido na demanda inicial. “O magistrado indeferiu o pedido liminar alegando que não há proibição sobre regulamentar o comércio de armas no Brasil e que houve inconstitucionalidade apenas dos parágrafos únicos dos artigos 14 e 15 e do artigo 21 da Lei 10.826/2003. No entanto, em nenhum momento a petição inicial do MPF opôs-se à possibilidade de regulamentação do comércio de armas. A causa de pedir refere-se exclusivamente aos limites das regulamentações ora impostas pela União, marcadas por ilegalidade, porque descumprem o Estatuto do Desarmamento”, esclarece o procurador.
Entenda o caso – no final do ano passado, o MPF ajuizou ACP com pedido de antecipação de tutela de evidência para que a União fosse proibida de utilizar regulamentações ilegais (artigo 12, § 1º, do Decreto nº 5.123/2004, e artigo 6º, § 1º, da Instrução Normativa nº 23/2005, do Departamento de Polícia Federal) que exigem comprovação à autoridade policial da necessidade de aquisição e registro de arma de fogo.
Ailton Benedito disse, à época, que a lei federal n° 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento) exige apenas que o interessado em adquirir arma de fogo apresente “declaração de necessidade” (artigo 4º, caput). No entanto, os referidos Decreto e Instrução Normativa, a pretexto de regulamentar a lei, extrapolam o poder regulamentar, exigindo, também, “documentos que comprovem a efetiva necessidade” de aquisição e registro de arma (artigo 6°, § 1°, da IN), submetendo o cidadão a decisões discricionárias da Polícia Federal (artigo 12, § 1°, do Decreto).
“O tema integra a defesa dos direitos humanos insculpidos na Constituição Federal, especialmente à vida, à liberdade, à propriedade e à segurança pública, não podendo a Administração Pública colocar entraves para a aquisição e registro de armas de fogo aos cidadãos que cumpram rigorosamente o previsto no Estatuto do Desarmamento”, defendeu o procurador.
De acordo com a ACP, caberia à autoridade administrativa competente verificar, exclusivamente, de forma objetiva, o atendimento pelo interessado dos requisitos fixados pelo artigo 4° do Estatuto do Desarmamento, sem juízos de conveniência e oportunidade, caracterizadores de discricionariedade, instituídos ilicitamente pelo Decreto n° 5123/2004 e IN n° 23/2005.
A ACP foi ajuizada a partir de elementos apurados em Inquérito Civil (IC), no qual o MPF apurou ações e omissões ilícitas da União, por intermédio do Ministério da Justiça e da Polícia Federal, relativamente ao cumprimento dos requisitos impostos aos cidadãos para o comércio e registro de armas (ver notícia).
Informações apuradas no IC apontaram que cidadãos encontram enormes obstáculos ilícitos para adquirir e registrar armamento de uso permitido em todo o território nacional, embora a legislação possibilite o comércio e registro legal de armas de fogo, desde que o interessado cumpra os requisitos legais.
O IC foi instruído com diversos documentos encaminhados por órgãos públicos, entidades e cidadãos, bem como com os elementos colhidos durante audiência pública realizada no dia 21/11/2017, a qual tratou do tema “Segurança Pública e Estatuto do Desarmamento” (clique aqui e assista ao vídeo completo da audiência), que contribuíram para o esclarecimento da matéria. Cabe ressaltar, ainda, que a situação é mais preocupante para os cerca de 32 milhões de brasileiros que residem na zona rural, que não são alcançados pelos órgãos estatais de segurança pública e estão à mercê de violência crescente no campo.
Na ação, o MPF requer à Justiça Federal que, além de proibir que a União utilize regulamentações ilegais, seja obrigada a revisar todos os requerimentos de aquisição e registro de arma de fogo protocolizados nos últimos cinco anos, a fim de identificar os casos de indeferimento da outorga com base em exigência de qualquer comprovação à autoridade policial de necessidade de aquisição. Tais pedidos, entre outros, repetem-se no agravo de instrumento interposto ao TRF1. Fonte: MPF-GO