Médico do TJGO investigado por abuso sexual é denunciado por improbidade administrativa

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O médico Ricardo Paes Sandre foi denunciado, nesta segunda-feira (01), pelo Ministério Público do Estado de Goiás por ato de improbidade administrativa. A ação civil pública se baseia em denúncias de servidoras do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, que apontaram a prática de assédios moral e sexual e abuso de poder, além de outras irregularidades envolvendo o exercício profissional. Os crimes teriam acontecido entre os anos de 2013 e 2018. O médico, no entanto, nega todas as acusações.

Membros do MP durante entrevista hoje sobre a ação contra o médico

Em entrevista na tarde desta terça-feira (02), na sede do MP, no Setor Jardim Goiás, em Goiânia, da qual também participou o procurador-geral de Justiça, Ailton Flávio Vechi, a promotora de Justiça Fabiana Lemes Zamalloa do Prado avisou que a ação civil pública abrange apenas as situações de assédio moral, sexual e abuso de poder em razão do gênero e narra a situação de dez mulheres – três estagiárias, duas psicólogas, duas auxiliares administrativas, uma técnica em enfermagem, uma fisioterapeuta e uma técnica em higiene dentária.

A representante do órgão ministerial afirmou que as mulheres noticiaram as práticas abusivas e assediadoras do médico, como constrangimento, humilhação e importunação sexual. Estes crimes, no entanto, já prescreveram e não podem mais resultar em ação penal contra o médico, pois o prazo para denúncias desse tipo penal é de apenas seis meses.

Segundo a promotora de Justiça, na ação é pedida a suspensão cautelar do exercício do cargo e a perda do cargo público ocupado por Sandre, que é genro do ex-presidente do TJGO, desembargador Gilberto Marques Filho. A representante do MP conta que também foi determinado o encaminhamento de cópia da investigação para o Conselho Regional de Medicina de Goiás (Cremego) para adoção das providências legais, e à Polícia Federal, para cassação do porte de arma do réu. “Ele usava sua arma ostensivamente, como forma de intimidar os servidores”, afirma.

Denúncia inicial

Além de Fabiana Zamalloa, os promotores de Justiça Geibson Cândido Martins Rezende, Juan Borges de Abreu e Carmem Lúcia Santana de Freitas são responsáveis pelas investigações, que tiveram início em abril do ano passado. Sete mulheres procuraram o MP para denúncias os abusos. Até o fim do mês passado, foram ouvidas 98 pessoas, entre servidoras efetivas e comissionadas e estagiárias que prestavam serviço no Centro Médico do TJ-GO.

Médico Ricardo Sandre

De acordo com os promotores, a cada depoimento alguém se referia a outra pessoa que supostamente teria sofrido assédio ou abuso de poder por parte de Ricardo Sandre. Também era visível o receio que vítimas e testemunhas tinham do réu e das consequências decorrentes do fato de depor no inquérito civil público. Inclusive, em muitas audiências, as pessoas ouvidas indagavam se o médico teria acesso ao depoimento, demonstrando muita preocupação com essa possibilidade.

Ricardo Sandre, narra a ação civil pública, “adotou um modo de gerir fundado no autoritarismo e na perseguição àqueles que questionavam suas decisões ou o desagradavam”. Também teria adotado decisões administrativas desvinculadas do interesse público para atender interesse pessoal, submetendo os que a ele se opunham a situações de humilhação e constrangimento. “Passou a importunar as servidoras, com abordagens de cunho sexual explícito, até mesmo com solicitação ou oferecimento de favores sexuais”, afirma Fabiana Zamalloa.

A investigação apurou também que Ricardo Sandre instalou clima de terror psicológico, espalhando medo, receio e pavor entre os servidores, em função do grau de parentesco com o presidente do TJ-GO e pelo porte ostensivo de arma de fogo. E foi justamente pelo porte ostensivo de revólver, que os promotores pediram que a Polícia Federal seja notificada.

Segundo os promotores narram na ação, as vítimas afirmaram temiam represálias uma vez que Ricardo Sandre arrogava-se a condição de “genro do presidente do TJ-GO, irmão de juiz de Direito e de delegado da Polícia Federal”. De acordo com as apurações, na condição de diretor-geral de Saúde do TJ-GO – cargo ou função inexistente na estrutura daquele Poder –, o médico assediou moral e sexualmente servidores públicos, humilhou servidores, abusando de seu poder hierárquico, violou a dignidade deles no exercício de suas funções, com sérios danos à saúde física e mental e ao ambiente de trabalho.

Ainda de acordo com a ação civil pública, o médico teria violado princípios regentes da administração pública, como a moralidade administrativa, a impessoalidade e a eficiência, para satisfazer interesses pessoais. Essas atitudes, segundo os promotores, tiveram reflexos também na qualidade e eficiência dos servidores públicos e a imagem do Poder Judiciário, o que caracterizaria ato de improbidade administrativa. 

Defesa

O advogado Thomaz Ricardo Rangel, da banca que faz a defesa do médico Ricardo Paes Sandre disse, em entrevista coletiva na tarde de terça-feira (2) que “é um alívio poder exercer a defesa longe do monopólio do Ministério Público de Goiás”, referindo-se ao fato do MP-GO finalmente protocolar ação civil pública contra o cliente. Até agora, Ricardo Paes Sandre foi objeto das investigações. Nesta fase pré-processual tudo o que foi mostrado pelo MP-GO serve apenas para o próprio MP apresentar a ação.

Segundo ele, agora, com a ação na Justiça que a defesa vai trabalhar, juntar provas e testemunhos que desmentem as alegações contra o médico. “Até agora a narrativa foi unilateral”, disse, afirmando que a  defesa quer deixar claro que as denúncias contra o médico possuem narrativas coincidentes com a reforma administrativa que ele promoveu no centro de saúde do Tribunal de Justiça e que exigiu o cumprimento da carga horária dos servidores.

Para o advogado, as queixas-crimes promovidas pelo médico Ricardo Paes Sandre não foram processadas pelo Judiciário não porque os fatos não aconteceram ou não tenham relevância. A Justiça entendeu, em tese, os crimes cometidos contra o médico são mais graves do que aqueles aos quais é apontado como autor.

Thomaz afirmou que as investigação do MP-GO ressignificou o uso de arma de fogo pelo médico em uma reunião com peritos criminais em que se discutia exatamente a possibilidade da Polícia Federal conceder aos profissionais o porte de arma de fogo. “Na ocasião, o médico explicou a um dos colegas que qualquer pessoa pode requerer o porte junto à PF, mostrando a arma de sua propriedade desmuniciada. Em momento algum houve disparos ou a mesma foi apontada a quem quer que seja”.

*Notícia editada às 19h57