Ex-miss Goiás é absolvida da acusação de ter assassinado amiga em Anápolis

A dançarina e ex-miss Goiás Luana Nadejda Jaime, 41 anos, foi absolvida da acusação de ter assassinado sua amiga Gilvânia Lima de Oliveira em 3 de dezembro de 2000. O julgamento terminou na tarde de sexta-feira (11/4) no Fórum de Anápolis. O júri foi presidido pelo juiz Jesseir Coelho de Alcântara. As informações são do Jornal Opção

Entendendo que não havia provas suficientes para a condenação da acusada, o júri absolveu Luana por quatro votos a três. Os promotores responsáveis pelo caso, Wesley Branquinho e Wellington Campos já anunciaram que vão recorrer da decisão. A filha da vítima, Amanda Pacheco, disse já não ter mais esperanças na Justiça.

De acordo com as investigações, Gilvânia foi morta no início de dezembro de 2000 em um terreno baldio no loteamento do Privê Lírios do Campo, em Anápolis. A responsável pela morte seria Luana, que, após sair com a amiga para um bar, a teria levado para uma área isolada e a assassinado com três tiros. O motivo seria a suspeita de que a vítima tivesse um caso com o então namorado da acusada, um estadunidense chamado Joseph.

O julgamento começou por volta das 9h com o depoimento das testemunhas arroladas pela defesa e pela acusação. A primeira ouvida foi Fabiana da Silva, que à época do crime trabalhava em uma residência próxima ao local onde o crime teria sido cometido. Ela confirmou o depoimento feito à delegada durante as investigações do caso, atestando que viu passar por lá um veículo Fiat Tipo de cor vermelha, mesmas características do carro de Luana. O carro era dirigido por uma mulher loira, cor do cabelo que, segundo várias testemunhas, a acusada tinha na época.

 Outro dos ouvidos foi Cláudio Basílio, tio-avô de Luana. Ele relatou ter recebido uma ligação de Fausto Jaime, pai da acusada e seu sobrinho, dias depois do crime, pedindo para que Luana pudesse ficar na casa do depoente em Saquarema (RJ) por alguns dias. Ele afirmou não ter detalhes do motivo da suposta viagem que Luana pretendia fazer, mas informou ao seu sobrinho que a casa estava sem móveis e que, por isso, indicaria a casa de sua irmã.  

Basílio disse não ter qualquer lembrança de seu depoimento prestado na delegacia à época do crime alegando problemas decorrentes do alcoolismo do qual sofria, ainda que tenha afirmado não estar sob efeito de álcool naquele dia. Na ocasião, ele relatou que Luana havia começado a utilizar drogas e que, desde então, estava com um comportamento violento.

Basílio ressaltou que em determinada ocasião Luana discutiu com sua irmã, Tatiane, que teve que sair de casa por medo de ser assassinada. Segundo o tio-avô, era bastante plausível que Luana tivesse, de fato, assassinado Gilvânia. Nesta sexta, ele alegou não se lembrar de ter feito nenhuma dessas declarações, apesar de uma assinatura ter sido reconhecida como sua no documento que contém o depoimento.

Depoimento de Luana

Luana foi a próxima a prestar depoimento. Ela contou ter conhecido Gilvânia em Roma, na Itália, em 1992. A acusada refutou ter cometido o crime ou ter qualquer motivação para tal, já que, segundo ela, a história de que sentia ciúmes da amiga não procedia.

Luana afirmou ter tomado conhecimento da morte de Gilvânia apenas enquanto estava em Saquarema, no Rio de Janeiro, informada por seus próprios pais. Ela refutou que estivesse loira à época do crime, afirmando que mantinha seus cabelos em cor natural.

Questionada se tinha vídeos e fotos em poses sensuais na internet, Luana afirmou que, se havia algum, não tinha conhecimento. Alguns desses vídeos estão vinculados a um perfil com o nome dela no YouTube. Ela negou também que tivesse posado em qualquer fotografia com uma arma na mão, conforme circulou na internet nas últimas semanas. “Photoshop”, alegou.

Debates

Durante a sessão de debates, a promotoria se focou nos depoimentos das testemunhas que reconheceram Luana e o carro dela no local próximo ao crime. Eles contestaram as informações de que Luana não tinha cabelos loiros na época, contrastando com os relatos de testemunhas que teriam, inclusive, sentado com ela em uma mesa de bar no dia do crime e confirmado que era essa a cor de seu cabelo.

Eles frisaram o testemunho de Cláudio Basílio que havia dito que Luana tinha passado a usar drogas e estava com o comportamento agressivo. Diante do recuo do depoente, os promotores ressaltaram que a assinatura no documento conferia com a de Basílio e desqualificaram a justificativa de que pudesse não se lembrar de suas declarações por conta do alcoolismo.

Branquinho e Campos pontuaram também que o pai de Gilvânia havia flagrado as duas em uma discussão que demonstraria o caráter ciumento de Luana. Na casa da vítima, a acusada teria exigido que fosse apresentado seu passaporte para comprovar que ela não teria ido aos Estados Unidos se encontrar com seu namorado. Naquele mesmo dia as duas saíram para um bar e Gilvânia acabou assassinada.

 A defesa, composta por Pedro Sérgio dos Santos e Jhonatan Rios, se focou na falta de provas para a condenação de Luana. Eles ressaltaram que, mesmo com indícios de sangue no carro da acusada, em nenhum momento foi realizado um exame de DNA para comprovar se tinha o mesmo material genético de Gilvânia. Os advogados criticaram também o fato de não ter havido um procedimento de identificação da acusada, ainda que testemunhas tivessem relatado ter visto alguém “parecido” com Luana no dia e local do crime. Se valendo do princípio in dubio pro reo, os advogados declararam que, por não haver indícios fortes o suficientes para a confirmação da participação de Luana, ela deveria ser absolvida.

Jonathas ressaltou que a mídia pode ter tido papel fundamental para que Luana fosse colocada como acusada do crime. Segundo o assistente da promotoria, ela era a suspeita mais próxima da vítima e, como a polícia precisava apresentar resultados devido à pressão da imprensa, acabaram levando ao seu indiciamento mesmo que sem provas contundentes.

Foi destacado que diversas testemunhas confirmaram não haver qualquer briga ou desavença entre acusada e vítima. Principalmente, foi reforçado o fato de que a esposa de um dos antigos namorados de Gilvânia, Ângela Marta, teria feito ameaças à vítima nos dias anteriores ao crime, sem que isso tivesse conduzido à uma investigação mais aprofundada por parte da polícia.

Desqualificando o trabalho realizado pelos investigadores e destacando a precariedade do serviço da polícia técnico-científica, os advogados pediram que Luana não fosse condenada por não haver possibilidade de ter certeza de sua participação no crime. “Pior que inocentar um culpado é condenado um inocente”, defendeu Pedro Sérgio.

Decisão do júri

Com o veredito do júri, que por quatro votos a três decidiu pela absolvição da acusada, Amanda [à esquerda], filha da vítima, que demonstrava intenso nervosismo durante todo o julgamento, pareceu estar impassível, mas não demorou muito para que demonstrasse sua revolta em lágrimas. Ao Jornal Opção Online, ela disse estar convicta de que Luana é a assassina.

Ela afirmou não ter qualquer expectativa de que Luana acabe condenada em possíveis próximos julgamentos. “Já foram 14 anos. Até que o recurso seja julgado, o crime já vai ter prescrevido. Mesmo que ela fosse condenada, tenho certeza absoluta que ela fugiria”, disse tentando conter o choro.

Ela contou também ter conhecido a acusada. Na época do crime, Amanda tinha 11 anos. “A amizade entre elas não era próxima. A amizade maior era com a irmã da ré. Ela não era uma pessoa próxima”, disse. “É frustrante perceber todas as mentiras. Mesmo quando o advogado de acusação perguntou se ela mantinha vídeos no YouTube ela negou. Qual é o intuito dela de mentir? Por mínimas coisas nós vemos a integridade da pessoa.”

Já Luana declarou estar feliz “que tudo tenha se esclarecido”. Visivelmente emocionada, ela deixou o Fórum ao lado do pai, Fausto Jaime.

O advogado Pedro Sérgio pontuou que toda decisão do júri “tem que ser respeitada”. “A Constituição Federal diz que o júri é soberano em suas decisões e Luana carregou esse fardo por 14 anos e agora é absolvida depois desse longo debate. Foi possível analisar detalhadamente que o processo não tinha as provas devidas e, portanto, a sociedade deve se dobrar à decisão do júri que reconhece a inocência dela.”

O Caso

Segundo os depoimentos de testemunhas durante o processo de investigação, Luana, filha de um conceituado médico de Anápolis, e Gilvânia eram amigas próximas, apesar de a segunda nutrir certo desprezo por Luana, por considerar seu comportamento fútil e destemperado.  As duas chegaram a fazer uma viagem internacional juntas, cujas consequências podem ter culminado na morte de Gilvânia.

A vítima teve um caso com um italiano chamado Roberto Illano durante um período em que esteve em Roma, em 1996. O breve relacionamento teve continuidade por meio de frequentes contatos telefônicos mantidos após o retorno da jovem a Goiás. Nessas conversas, havia sempre a promessa de que um dia poderiam viver juntos.

No entanto, dificuldades diversas postergaram o reencontro entre ambos por vários meses, até que em 1998 surgiu uma oportunidade. Em uma conversa com Illano, Gilvânia relatou que Luana, que mantinha um caso com um norte-americano, identificado como Joseph, prometeu que a ajudaria na viagem caso ela se dispusesse a acompanhá-la durante uma temporada em que ficaria na Suíça.

Após dois meses naquele país na companhia da então amiga, Gilvânia pôde reencontrar Illano e ampará-lo no período difícil em que estava vivendo, já que sua mãe, enfrentando um câncer havia oito anos, encontrava-se em estágio terminal da doença. A reunião entre eles, porém, não foi das mais felizes, uma vez que, além dessa questão de saúde, Gilvânia relatou ter mantido um relacionamento com Erich Frischknecht, um amigo de Luana, durante o tempo em que esteve na Suíça. O caso, entretanto, não foi grande impedimento para o italiano, que ainda assim manteve o desejo de construir uma vida e uma família com Gilvânia.

O primeiro filho do casal – e o segundo de Illano, que já tinha um jovem chamado Massimiliano – nasceu em julho de 1999. O nascimento da criança, porém, não assegurou estabilidade na relação, que se encerrou em outubro daquele mesmo ano após uma série de desentendimentos. Logo, Gilvânia voltou ao Brasil, trazendo consigo o pequeno Leonardo.

Ainda assim, a goiana e Illano continuaram mantendo contatos telefônicos, e foi por meio deles que perceberam que a separação havia sido um erro. Assim, no ano seguinte, Roberto e Massimiliano vieram a Goiás por um período de 20 dias, para reencontrar Gilvânia.

Em 7 de novembro daquele ano, ela voltou à Roma, deixando Leonardo com seus pais, em Anápolis. Na capital italiana, ela relatou a seu companheiro alguns fatos que o deixaram consternado.

Segundo o depoimento prestado, Gilvânia contou a Illano que, enquanto esteve no Brasil, recebeu a visita de Erich Frischknecht, afirmando que tinha vindo ao país com o único intuito de visitá-la e tentar reatar o romance. Diante das negativas de Gilvânia, que assegurou estar prestes a retornar à Itália para viver com Illano, o suíço a teria ameaçado de morte, dizendo que preferia que ela morresse a saber que estava com outro homem. A jovem, porém, não se abalou e resistiu às investidas de Erich, reafirmando que pretendia morar na Itália.

Poucos dias depois, Gilvânia recebeu nova visita, dessa vez de uma brasileira, de nome Marta Fiares. Esta teria dito à goiana que era esposa de Erich e, acreditando que os dois ainda tivessem um caso, a ameaçou de morte caso ela se recusasse a parar de se encontrar com seu marido. Apesar do choque causado pela situação, aparentemente nem Roberto nem Gilvânia deram muita importância para o fato, acreditando que essas questões haviam ficado no passado.

Tudo mudou quando no dia 1º de dezembro de 2000 Gilvânia retorna ao Brasil para buscar Leonardo, prevendo o retorno para o país europeu entre os dias 26 ou 27 daquele mês. Antes do reencontro, no entanto, a jovem acabou assassinada.

De acordo com os depoimentos da mãe e do pai de Gilvânia, Luana esteve na casa da família no dia 3 de dezembro. Era a primeira vez que ela lhe fazia uma visita. Entre conversas sobre amenidades, surgiu a acusação, por parte de Luana, de que Gilvânia, ao invés de ter viajado para a Itália para reencontrar Illano em novembro daquele ano, teria, na verdade, ido aos Estados Unidos encontrar o namorado da acusada.

Mesmo com as refutações de Gilvânia, Luana exigiu que a moça mostrasse seu passaporte comprovando que ela não teria ido aos EUA. Se Gilvânia chegou a apresentar ou não o documento, nenhuma das testemunhas sabe dizer. O que se sabe é que naquele mesmo dia as duas saíram de carro, aparentemente já de forma amistosa, mas só uma delas voltou para casa.

O corpo de Gilvânia foi encontrado no dia seguinte. O laudo do exame tanatológico demonstra que a vítima foi atingida por três disparos de uma arma calibre 380: um na cabeça, um no ombro e outro no braço, todos com trajeto da esquerda para a direita.

O relato de uma testemunha que, na ocasião do crime, trabalhava em uma casa próxima ao local onde o crime teria sido cometido, dá conta de que por volta das 19h15 do dia 3, duas mulheres — que correspondem às características de Luana e de Gilvânia — foram vistas circulando no local em um carro Fiat Tipo de cor vermelha, mesmas descrição do veículo da acusada.

A testemunha conta que a mulher loira que dirigia o carro tinha a mão direita no volante e a mão esquerda estava abaixada, “como se estivesse segurando alguma coisa”. Para ela, a loira em questão procurava uma entrada para o terreno baldio que existia na região. Alguns minutos após ter retornado à casa de sua patroa, ela conta ter visto o carro saindo do mato e voltando para o asfalto. Em uma conversa com uma amiga que também trabalhava nas proximidades ela ficou sabendo que barulhos de tiros foram ouvidos vindos daquele terreno.

Os exames de luminol realizados no carro da acusada comprovaram que havia vestígios de sangue na porta e no banco do passageiro, no piso e no carpete do veículo. Apesar de todos os indícios, Luana sempre negou que tivesse qualquer relação com a morte de Gilvânia.

Para os pais da jovem assassinada, o crime teria sido cometido por conta da suspeita quanto a um possível relacionamento entre a vítima e o namorado da acusada, residente nos Estados Unidos. Já para Illano, a hipótese mais provável é que o homicídio tenha sido uma encomenda de Erich Frischknecht, insatisfeito com o término de seu envolvimento com Gilvânia.

Ainda que sem um motivo claro para o delito, dadas às provas e relatos colhidos, a Justiça pronunciou a ré, determinando que fosse submetida ao julgamento perante júri. A defesa da acusada, representada judicialmente pelo advogado Pedro Sérgio dos Santos, pediu a revogação dessa decisão, além da exclusão dos qualificadores: motivo fútil e utilização de recurso que dificulta a defesa da vítima, alegando inocência da acusada. Em 7 de dezembro de 2009, a 2ª Vara Criminal rejeitou os pedidos da defesa e manteve a pronúncia da acusada, assim como os qualificadores do homicídio. No entanto, ela foi mantida em liberdade, já que Luana é ré primária e acompanhou todos os processos para os quais foi intimada durante as investigações.

Fora da prisão, Luana ganhou certa notoriedade participando de programas de TV em Goiás, se apresentando como dançarina, além de manter páginas populares no Facebook – que foram retiradas do ar recentemente. Uma foto de Luana segurando uma arma de fogo esteve circulando na internet nas últimas semanas, mas também foi retirada do ar.