Em decisão inédita, TJGO anula arrematação de fazenda após quase quatro anos da imissão de posse

Em decisão inédita, o Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) anulou arrematação de uma fazenda, em Anicuns, no interior do Estado, quatro anos após a imissão de posse. O imóvel foi adjudicado em outubro de 2014 e a carta imediatamente expedida, sem que fossem observados princípios constitucionais – devido processo legal e contraditório. Além disso, a avaliação do imóvel foi feita um ano antes do mesmo ser arrematado.

Advogados João Domingos da Costa Filho e Leandro Marmo Carneiro.

Diante disso, o relator do recurso, desembargador Alan Sebastião de Sena Conceição, acolheu as teses da defesa de vileza do preço; nulidade do auto de arrematação; e cerceamento de defesa. O voto foi acompanhado pelos integrantes da 5ª Câmara Cível do TJGO. O proprietário do imóvel foi representado na ação pelos advogados João Domingos da Costa Filho e Leandro Marmo Carneiro, do escritório João Domingos Advogados Associados.

O fazendeiro relata na ação que a carta de adjudicação foi expedida sem que houvesse sido facultado, previamente a ele, a oposição de Embargos de Adjudicação. Conforme a jurisprudência, é imprescindível que haja o transcurso de pelo menos cinco dias, entre a lavratura do auto e a expedição da carta, justamente para que o executado possa propor o referido recurso. O que, no caso em questão, não ocorreu. Consequentemente, não foram respeitados os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório.

Além disso, o fazendeiro cita ausência de atualização monetária do valor da avaliação. Isso porque, o imóvel arrematado foi avaliado em setembro de 2014 e o valor sustentado até julho de 2015, quando foi arrematado e lavrado o auto de arrematação. Fato que fere o princípio da menor onerosidade da execução e da isonomia das partes. “Eis que o débito exequendo foi devidamente atualizado ao tempo da arrematação, e o imóvel teve significativa valorização neste entretempo, a qual, todavia foi desprezada”, observam os advogados.

Decisão
Em sua decisão, o desembargador lembrou que observado o princípio do contraditório, o credor poderá requerer a adjudicação do bem penhorado, mas desse pedido deve o devedor ser cientificado, para que sobre ele se manifeste, podendo, nos termos do artigo 651 do CPC/73, remir a execução.

Sustentou que, não obstante a atualização do débito exigido pelo credor, o mesmo não se verificou no tocante ao do bem penhorado. Isso porque foi mantido o mesmo valor do laudo de avaliação confeccionado em novembro de 2009. Ou seja, quase cinco anos antes do acolhimento do pedido de adjudicação.

“Situação que, sem dúvida alguma, feriu o princípio da isonomia, posto que constitui fato notório que nos últimos anos o “boom imobiliário” ocorrido no país provocou em pouco tempo grande valorização dos bens imóveis”, disse. O desembargador observou ainda a discrepância entre o valor da avaliação do bem imóvel feita por profissionais do mercado, quase o dobro da feita pelo adjudicado. “Condicionante a provocar inegável enriquecimento sem causa do credor em detrimento do devedor”, completa.
O magistrado disse que o Direito não socorre àquele contumaz inadimplente que se furta a todo instante o cumprimento de suas obrigações, mas também não compactua com o chamado enriquecimento sem causa à custa de avaliações de bens defasadas no decurso do tempo.

Vitória
Os advogados do fazendeiro enalteceram a decisão por reconhecer as nulidades arguidas. Especialistas neste tipo de defesa, os profissionais ressaltam que vale a pena o produtor rural acreditar no Poder Judiciário para reaver patrimônio expropriado injustamente, e sustentam que foi uma decisão judicial histórica.
“Foi vitória não somente do fazendeiro e da classe de produtores rurais, mas também extensiva à empresários, que não raramente tem seus patrimônios expropriados por bancos e agiotas, em processos altamente onerosos e injustos”, observaram.