Compliance: por quê, quando e onde aplicar?

Com pouco mais de dois anos em vigor, a Lei Anticorrupção (Lei 12.846013) – também conhecida como a Lei da Empresa Limpa – é considerada um avanço no ordenamento jurídico brasileiro. A Operação Lava Jato fez com que muitas empresas saíssem em busca de profissionais do Direito para implementar programas e políticas corporativas relacionadas a controles internos e de integridade: o chamado Compliance.

A advogada Marina Coelho de Araújo, sócio do Costa, Coelho Araújo e Zaclis Advogados, considera que a lei é um importante avanço no combate à corrupção porque prevê a responsabilidade das empresas pela prática de atos lesivos contra a administração pública nacional ou internacional.

Doutora em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e Especialista em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra, Marina ressalta que o mercado de Compliance está em crescimento, mas a maior barreira é encontrar disposição para mudar a cultura da empresa. “Sem o comprometimento de quem manda, da diretoria, o programa nasce fadado ao insucesso. Só é possível implementar um programa de cima para baixo”, afirma Marina Coelho Araújo, que é Membro da Comissão de Direito Penal e Processual Penal da OAB/SP.

1)O que mudou desde a entrada em vigor da Lei Anticorrupção no Brasil? A lei brasileira é um avanço ou não?

A legislação anticorrupção brasileira incorpora diretrizes muito próximas do combate à corrupção na legislação americana. O FCPA (lei americana de combate à corrupção) já tem bastante aplicação nos EUA e vem norteando os especialistas que trabalham com o tema no Brasil. Muita coisa mudou desde a entrada em vigor da lei, em razão de previsões legais de diminuição da multa imposta à pessoa jurídica se ela comprovar a existência institucional de programas de integridade (como a legislação chamou os programas de Compliance). Assim sendo, as empresas buscam estruturar seus sistemas e organizar sua gestão para minimizar os riscos de multas decorrentes de atos de corrupção ocorridos no âmbito da companhia.

Considero que a lei brasileira é um avanço sim. É uma tentativa. A lei tem diversos problemas, mas a expectativa é que avance o combate à corrupção.

2)As empresas e governos já estão adaptados à nova lei? Já existe algum resultado positivo que possa ser destacado?

Não, as empresas ainda estão se adaptando. Há muitas empresas pequenas e médias iniciando agora o conhecimento do tema. O resultado positivo, em meu entender, é a preocupação das empresas com o tema, e o desenvolvimento de medidas anticorrupção. Só isto já terá grande impacto na transparência dos negócios no Brasil.

3)As empresas multinacionais são as que mais se preocupam com programas de anticorrupção ou isso é mito?

Não é mito, é verdade. Isto porque as legislações americana e inglesa são muito violentas no que se refere à multa e punição da pessoa jurídica. Não apenas a pessoa física é punida, como também a pessoa jurídica, penalmente.

4)Como funcionam as práticas de Compliance em outros países? Tem algum país que se destaca? O fato de um país ter fama de ser mais ou menos corrupto pode interferir ou prejudicar a aplicação de práticas de Compliance?

Os países europeus e os EUA já se movimentam desde algum tempo em prol da transparência e estruturação de responsabilidade nas companhias. Assim, os sistemas desenvolvidos pelas associações privadas estão em avançado estágio. Acredito que o fato de o país estar pior colocado no ranking da corrupção (principalmente nos índices da transparência internacional) pode interferir na rigidez do controle de riscos. O Compliance (programa de integridade) é totalmente baseado em sistemas de risco e escolha dos riscos toleráveis. Assim sendo, a “fama” de um país pode interferir neste mapeamento de riscos.

5)As experiências com Mensalão e Lava Jato farão com que as empresas passem a se preocupar mais com programas anticorrupção ou são casos isolados que não refletem a realidade brasileira?

Acredito que a Lava Jato já está fazendo isto. Muitas empresas iniciaram seus processos de Compliance a partir dos anúncios da Lava Jato. Além disto, os primeiros acordos de leniência serão feitos com empresas que estão nos setores investigados.