Caixa dois é desafio para Justiça Eleitoral

O Ministério Público Federal (MPF), por meio da Procuradoria Regional Eleitoral em Goiás, já trabalha a fim de combater irregularidades relativas às eleições de outubro próximo. A informação é do procurador regional eleitoral Marcello Santiago Wolff, que contradiz o que foi dito pelo presidente da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi), Ilézio Ferreira, em entrevista ao programa O HOJE De Frente Com o Poder, divulgada no último domingo. Na ocasião, o empresário alegou que os órgãos competentes não tomam providências contra o chamado caixa dois, prática comum em época de campanha, segundo Ilézio, praticada também por empresas do ramo imobiliário. As informações são do jornal O Hoje.

Segundo Wolff, o MPF tem atuado no sentido de recolher provas que possam configurar campanha extemporânea, seguindo orientação do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. “É um desafio importante e, para isso, vamos repetir o que foi feito em 2006, com a reunião, na época da campanha, de provas dos chamados gastos visíveis, mas que não são declarados à Justiça Eleitoral”, conta. De acordo com o procurador, a prioridade do órgão, em 2014, é combater os gastos ilícitos. Para ele, o grande impacto das manifestações populares do ano passado podem influenciar a forma como a Justiça Eleitoral tratará os casos de irregularidades apontados.

Comandado pelo então procurador regional eleitoral Hélio Telho (foto), o trabalho realizado em 2006 acabou não gerando o resultado esperado e os candidatos apontados nas investigações não foram punidos como se esperava. “O caixa dois é complicado porque só conseguimos visualizar a ponta do iceberg. Na época, a pena prevista, de cassação, foi considerada grande demais para o que conseguimos documentar, embora soubéssemos que havia muito por trás do que foi levantado”, lamenta Telho. Além disso, o grande número de candidatos envolvidos – quase a totalidade dos concorrentes no pleito – pode ter acabado forçando a justiça e pisar no freio na hora de fazer cumprir as penas. Afinal, seria uma interferência muito grande do judiciário, que mudaria o resultado das urnas.

Conforme relata Hélio Telho, o montante que forma o caixa 2 pode ser obtido de diferentes maneiras, mas é, invariavelmente, um dinheiro ilícito, ou seja, não pode ser declarado na prestação de contas exigida por lei. Segundo ele, a doação do recurso para campanhas eleitorais acaba direcionando o trabalho do detentor do mandato. “O candidato eleito trabalha para quem o elegeu. Se foi o povo que bancou, trabalhará para o povo. No caso as empresas, não é doação, é investimento”, resume. Conforme relata, há empresas que chegam a repassar dinheiro para candidatos adversários. “Ou seja, elas estão se garantindo”, emenda.

Solidário à proposta de Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), impetrada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), que tenta proibir o financiamento privado de campanhas eleitorais, Telho explica que, no caso das empresas do ramo imobiliário, as doações são mais comuns, ou maiores, para candidatos a vereador ou prefeito. “Isso ocorre porque são esses agentes que vão atuar no ramo de interesse dos doadores, como códigos de postura, expansão urbana”, relata. Na entrevista veiculada no último domingo, Ilézio Ferreira argumentou que a forma como as doações são tratadas pela atual legislação induz a prática do caixa paralelo. “Hoje, se você participa, é prejudicado”, alegou o presidente da Ademi.

Para o advogado eleitoral Dyogo Crosara, a proibição de doações por parte de empresas é apenas um passo numa reforma política que deve ser mais abrangente. Conforme explica, hoje, a legislação ainda permite a chamada “doação oculta”, pela qual a empresa doa determinada quantia ao partido, que repassa ao candidato. “Na prestação de contas, aparece que o doador foi a legenda e não essa ou aquela empresa”, completa. Sobre os recursos doados especificamente por pessoas jurídicas, Dyogo esclarece que é comum a constatação de benefícios recíprocos. “Os recursos captados por aquela empresa é diretamente proporcional à quantidade doada”, emenda.