Retificação de registro público: como alterar o nome?

Rogério Almeida

O nome é um dos principais direitos da personalidade, pois ele individualiza as pessoas. É considerado direito da personalidade por ser inerente a dignidade da pessoa humana, tendo proteção especifica nos artigos 16 a 19 do Código Civil Brasileiro, bem como na Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/1973).

Tem como características ser inalienável, imprescritível e imutável, conforme determina o art. 58 da legislação específica “o prenome é definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição por apelidos públicos e notórios”. Nota-se que é mais fácil alterar o sobrenome que o prenome, apesar de ambos representarem direito íntimo estritamente ligado à personalidade e identificação da pessoa.

Em decorrência da morosidade do poder legislativo para atualizar a Lei de Registro Civil (Lei 6.015/1976), os tribunais foram obrigados a criar novas hipóteses de alteração dos componentes do nome para adequar-se à realidade da sociedade atual, quais sejam:

  1. Adequação de sexo: Conforme entendimento jurisprudencial consolidado na I Jornada de Direito de Saúde, promovida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no ano de 2014, foi aprovado o enunciado em favor da retificação de registro para o transgênero, nos seguintes temos:

“Quando comprovado o desejo de viver e ser aceito enquanto pessoa do sexo oposto, resultando numa incongruência entre a identidade determinada pela anatomia de nascimento e a identidade sentida, a cirurgia de transgenitalização é dispensável para a retificação de nome no registro civil”.

Reiterando o entendimento supracitado, o Supremo Tribunal Federal, em agosto de 2014, reconheceu a repercussão geral sobre o tema no Recurso Extraordinário 670.422. Como consequência disso, criou-se uma nova hipótese para a retificação de nome do transgênero, independente de cirurgia de alteração de sexo.

  1. Para inclusão do sobrenome de um familiar remoto: Essa hipótese é muito conhecida, pois visa à introdução de sobrenome de um familiar distante para a obtenção de benefícios ou facilidades na obtenção de cidadania estrangeira. Não obstante ao debate sobre o tema entre os juristas, encontramos precedentes favoráveis, como, por exemplo, o Acordão 1.0024.06.056834-2/001, do TJMG, bem como em Belo Horizonte, Primeira Câmara Civil, Rel. Des. Armando Freire, julgado 04.09.2007, DJMG 19.09.2007.

Ainda que o entendimento não seja pacificado, tal realidade está sendo enfrentada cotidianamente pelo Poder Judiciário e, provavelmente, no futuro, será uniformizado pelos Tribunais Superiores.

Entretanto, o legislador dispensou cuidado especial ao menor de 18 anos criando exceção na norma para alteração do nome que atente contra sua dignidade ou com o qual não se identifique (art.56 da Lei de Registros Públicos. Após atingir a maioridade, o indivíduo terá o prazo decadencial de um ano para proceder com a alteração de seu nome, desde que não prejudique valores ou vocativos da família.

Contudo, existem possibilidades de alteração dos componentes do nome a qualquer tempo, desde que haja motivação aceitável que comprove lesão à pessoa ou em casos específicos, como os seguintes:

  • Substituição do nome que expõe a pessoa ao ridículo ou embaraços, inclusive em casos de homônimos – em caso de nomes iguais faz-se necessário prejuízo comprovado de dano patrimonial ou moral por confusão de pessoa;
  • Alteração em caso de erro de grafia crasso, perceptível de imediato.
  • Introdução de alcunhas ou cognomes
  • Introdução do nome de cônjuge ou convivente;
  • Introdução do nome do pai ou da mãe, havendo reconhecimento posterior de filho ou adoção;
  • Para tradução de nomes estrangeiros, que gerem embaraços na pronúncia pela sociedade local;
  • Em havendo coação ou ameaça decorrente da colaboração em apuração de crime (proteção de testemunha), nos termos da Lei 9.807/1999;
  • Para inclusão do nome de família do padrasto ou madrasta por enteado ou enteada, havendo motivo relevante para tanto, e desde que haja expressa concordância daqueles, sem prejuízo de seus apelidos de família (art. 57,§8.º, da Lei 6.015/1976, incluído pela Lei 11.924/2009);
  • Nos casos de abandono efetivo do genitor, excluindo-se o sobrenome paterno. Consoante ementa do Superior Tribunal de Justiça, publicada no informativo n. 555, “o direito da pessoa de portar um nome que não lhe remeta às angústias decorrentes do abandono paterno e, especialmente, corresponda à sua realidade familiar, sobrepõe-se ao interesse público de imutabilidade do nome, já excepcionado pela própria Lei de Registros Públicos.”.

Ressalta-se que a alteração de registro civil não poderá ser feita em casos que viole os bons costumes da sociedade, prejudique direito de terceiros ou quando utilizados de modo a lesar a responsabilidade criminal, civil ou administrativa do requerente, ou ainda para se esquivar de obrigações e obter proveitos ilícitos decorrente da alteração.

Para proceder com a ação de Retificação de Registro Público o interessado deve procurar o auxílio de um advogado ou defensor público. A ação será proposta na vara de registro civil da comarca em que reside, o ministério público faz-se necessário como fiscal da Lei (custos legis). Sendo julgado procedente o pedido do autor, o juiz determinará a averbação da alteração do nome que, posteriormente, será publicada pela imprensa.

Com o fim do processo alguns cuidados devem ser tomados, pois a retificação do registro não gera automaticamente uma nova documentação. Promover a alteração da documentação junto ao cartório de registro civil, secretarias estaduais, receita federal, órgãos de classe, entidades privadas que tenha relação como bancos, cooperativas, associação civil e todos os demais é incumbência do interessado.

Cada processo de retificação de registro tem duração diferente, dependendo da complexidade do caso. Contudo, se o interessado instruir o pedido com toda documentação necessária, demonstrando sua plausibilidade com provas idôneas, o juiz poderá julgar de forma célere, dando fim ao processo.

Tartuce, Flávio, Manual de direito civil: volume único/ Flávio Tartuce. 6. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016.
Farias, Cristiano Chaves de, Curso direito civil: parte geral e LINDB/ Cristiano Chaves de Faria, Nelson Rosenvald – 15. ed. rev., e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2017.

Brasil. Lei 6.015. Lei dos Registros Públicos. Brasil, 1976.

Brasil. Lei 11.924. Brasil, 2009.

Brasil. Lei 10.406. Código Civil Brasileiro. Brasil, 2002.

*Rogério Almeida é advogado, especialista em direito civil, sócio fundador do Escritório Rogério Almeida & Advogados Associados S/S; Presidente da Comissão da Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil-Seção Goiás (OAB/GO); Membro do Instituto Brasileiro de Política e de Direito do Consumidor (BRASILCON), Vice-Presidente da Associação Alphaville Clube de Goiânia/GO.