
*Ariston Araújo
A nova lei de licitações, 14.133, que nem é tão nova assim já que entrou em vigor no dia 1º.04.2021, estabeleceu que a utilização do pregão eletrônico para aquisição de bens e serviços comuns será obrigatória, salvo em casos especiais onde poderá ser admitida a modalidade presencial, desde que a decisão seja motivada, devendo a sessão ser registrada em ata e gravada em áudio e vídeo, para constar nos autos do processo administrativo, nos termos do § 2º do art. 17.
Acontece que, mesmo em vigor, a 14.133 permitiu que a Administração Pública pudesse optar por contratar sob a égide de seus dispositivos ou da antiga lei, 8.666/1993, pelo período de 2 anos após sua vigência, ou seja, até o dia 31 de março de 2023. No entanto, apesar de faltarem menos de três meses para a revogação da lei de 1993, também conhecida como The Walking Dead, poucos municípios têm utilizado a 14.133 para realização de pregões eletrônicos, sendo Goiânia e Aracaju os pioneiros.
Para os municípios com menos de 20.000 habitantes, entretanto, a lei 14.133 deu um prazo maior a respeito da obrigatoriedade de realização da licitação sob a forma eletrônica, de seis anos, conforme determina o seu art. 176, II.
Dito isto, pode se dizer, sem medo de errar, que a maioria esmagadora dos municípios brasileiros (e goianos sobretudo) nunca utilizou o pregão eletrônico em seus procedimentos licitatórios, preferindo os famigerados convites ou os pregões presenciais. Então, a pergunta que não quer calar: Por quê? Há vários motivos, sobre os quais vamos falar neste artigo.
Há que se dizer, por oportuno, que, mesmo para os municípios com menos de 20 mil habitantes, que não estão obrigados a utilizar o pregão eletrônico a partir de abril deste ano, é interessante que o façam, em nome da transparência, da economicidade e da probidade, princípios que norteiam os procedimentos licitatórios.
Mas voltemos à questão dos motivos que afastam os municípios (sobretudo os pequenos) do pregão eletrônico. Pode-se enumerar os seguintes: a) falta de infraestrutura tecnológica do município; b) ausência de pessoal qualificado para conduzir o procedimento, sobretudo os servidores efetivos no serviço público; c) receio de aparecerem licitantes do Brasil inteiro, prejudicando assim os empresários locais e, de consequência, gerando desgastes políticos para o gestor. Dentre estes motivos, o último é, na minha opinião, o preponderante. Mas considero esta hipótese uma meia-verdade, que pode muito bem ser remediada pela Administração, desde que haja iniciativa e criatividade. Vejamos.
Se o município começa a utilizar o pregão eletrônico sem estar adequadamente preparado para tanto, pode efetivamente acontecer que os vencedores da licitação sejam, em sua maior parte, de outros municípios. Daí a meia-verdade. Mas o pulo do gato é adotar as providências para que isto seja mitigado.
A primeira medida é utilizar-se, na elaboração do edital de licitação, os benefícios dedicados à micro e pequenas empresas de que tratam os artigos 42 a 49 da Lei Complementar nº 123/2006 (que institui o Estatuto Nacional das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte), em especial o art. 47, que privilegia o desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional (que o município pode regulamentar). Mas aí o estimado leitor pode ponderar: mesmo as empresas com sede em outros municípios/estados podem também ser enquadradas como microempresas ou empresas de pequeno porte, usufruindo também dos benefícios previstos na LC 123. É verdade, mas para contrapor a isto, o edital do PE deve prever a regra contida no inciso I, do § 1º, do art. 60 da Lei 14.133, segundo o qual, caso não haja desempate, será assegurada preferência aos licitantes estabelecidos no Estado a qual pertence o município.
Poderá também o edital da licitação prever a utilização de mão de obra, materiais, tecnologias e matérias-primas existentes no local de execução, conservação e operação do bem, serviço ou obra, conforme permissivo contido no § 2º do art. 25 da 14.133, o que irá com certeza, favorecer os empresários locais.
É claro que os empresários sediados no município que realiza o pregão eletrônico já têm uma vantagem adicional em relação àqueles de outros municípios ou estados, pois não terão a despesa com o frete, por exemplo, além de despesas com locomoção e estadia de seu pessoal na futura execução do contrato.
A segunda medida é qualificar seu pessoal, sobretudo o que trabalha na Comissão de Licitação, formando adequadamente os pregoeiros e a equipe de apoio (tem vários cursos de formação de pregoeiros no mercado, inclusive da Fundação Getúlio Vargas, por meio do EAD).
A terceira medida é fazer a adesão do município a uma plataforma tecnológica de realização de pregão eletrônico, que já esteja integrada ao Portal Nacional de Compras Públicas (PNCP), vez que o edital deverá obrigatoriamente ser publicado no Portal, ao teor do art. 54 da 14.133. Aqui abro um parêntese para dizer que as publicações no PNCP não são feitas diretamente pelo órgão promovente da licitação, mas pela plataforma que utiliza para realizá-la. Daí a importância que o município adira a uma plataforma que já se encontra integrada ao PNCP (minha sugestão é o Portal de Compras Públicas, de Brasília, que tem atuação com foco na municipalidade, é gratuito para os contratantes e ainda oferece assessoria sem qualquer custo para o erário).
A quarta medida é promover, por meio de ações próprias ou em parceria com o Sebrae, um trabalho de qualificação dos empresários locais para que possam participar do pregão eletrônico. É importante envolver nesta medida as entidades de classe representativas do empresariado local.
A quinta, e última medida, diz respeito à importância de a Administração contratar uma assessoria especializada para promover a implantação da lei 14.133 a partir de abril deste ano, não somente para introdução do pregão eletrônico na municipalidade mas, também, e sobretudo, para orientar sobre as regulamentações que devem ser feitas da lei 14.133, qualificação do pessoal que atua na área de contratação, inclusive os fiscais de contratos, que terão um papel relevante para o sucesso das aquisições.
*Ariston Araújo é advogado especializado em Licitações e Contratações Públicas.