Pets nos condomínios e as leis

*Wesley Cesar

Se por um lado a vida em comum é própria do ser humano, que desde sempre viveu em grupos, por outro isso não quer dizer que essa convivência é necessariamente pacífica ou de um consenso inabalável. Por isso o Direito rege as normas da vida comum, estabelecendo regras gerais que tentem amenizar e solucionar conflitos por meio da Lei. No caso da convivência dos condomínios existem leis próprias atentas a essa convivência. Uma questão conflitiva comum e recorrente, quem mora em condomínios ou prédios o sabe muito bem, é a presença de pets nas unidades particulares de cada morador e a circulação deles nos espaços comuns do condomínio. Afinal, o que diz a lei sobre a criação de animais nas unidades de cada morador, ou o que o condomínio e a figura do síndico podem arbitrar a esse respeito?

Não precisamos ir muito longe para imaginar uma situação corriqueira: um morador pega o interfone e liga para reclamar dos latidos do cachorro do vizinho, exige que este faça algo para sessar o barulho imediatamente. Não raro, o morador incomodado sobe o tom, faz ameaças. Não é também incomum que casos assim terminem em tragédias. Bem, o Direito justamente tenta resguardar as liberdades e deveres individuais e coletivos, justamente para que as situações de conflito não sejam resolvidas pelas próprias mãos, ou seja, para que situações como essas não recaiam em soluções indevidas e até mesmo trágicas.

Pois bem, a Constituição Federal resguarda como direito fundamental o direito à propriedade, entendido como Direito da pessoa física (e também jurídica) de usar, gozar e dispor de seu bem (Art 5°, inciso XII) dentro dos limites dos seus bens e respeitando o bem comum, é claro. De modo mais específico, o Código Civil dispõe no mesmo sentido da Constituições no que diz respeito também aos condôminos.  Indo um pouco mais adiante, a lei 4.591/64 dispõe que cada condômino “tem o Direito de usar e usufruir, com exclusividade, de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interesses (…)” (Art. 19). De modo que a proibição pura e simples, e ainda indiscriminada, de que os moradores possam criar animais de estimação em suas unidades é abusiva e ilegal.

No entanto, sabemos que o extremo oposto, a liberdade total, também acaba esbarrando em inconveniências e conflitos para a convivência comum entre condôminos. Por isso, as convenções de condomínio, ainda que não possam proibir irrestritamente a presença de animais, pode definir certas regras, como por exemplo o trânsito de animais em áreas comuns. Essas regras podem versar, inclusive, sobre a lei do silêncio, já que é dever de cada dono de animais controlar os latidos e outros barulhos que possam perturbar a convivência com os vizinhos. O bom senso e a boa-fé são princípios que regem o direito e a vida comum, e devem ser observadas caso a caso.

Assim, devemos dizer que a simples e pura vedação da criação de animais de estimação é abusiva, mas por outro lado o dono é responsável por zelar do bem comum, da boa convivência e não pode expor os demais moradores a situações de risco (no caso, por exemplo, de animais agressivos) ou de incômodo permanente. Existem meios de gestão de conflitos eficazes, como por exemplo, aplicativos em que moradores podem abrir ocorrências ou denúncias anônimas. Recomenda-se, ainda, que em caso de conflitos deve-se convocar a assembleia de condomínio para que a situação seja resolvida coletivamente pelos moradores, sem deixar que os conflitos ganhem contornos de ameaça e agressividade. Os condôminos possuem ainda o direito de buscar apoio técnico para se contraporem a decisões abusivas das convenções e podem até mesmo recorrer à Justiça para solucionar conflitos internos. A boa-fé e o bom senso é o que devem reger a vida em comum.

*Wesley Cesar Gomes Costa é advogado constitucionalista com atuação nas áreas eleitoral, municipal  e criminal.