O lado escondido do jogo: quem está realmente apostando no nosso futuro?

Aline Sena Barcellos e Isabela Resende Calixto*

Nas manchetes, o foco são os influenciadores. Virginia, Neymar, Felipe Neto, João Guilherme… Nomes que estampam campanhas milionárias de empresas de apostas online – as famigeradas “bets”. A narrativa é clara: são eles os vilões do vício, da manipulação e do endividamento em massa. Entretanto, será mesmo que o problema acaba neles?

A recente CPI das Bets, realizada em 13 de maio de 2025, jogou luz sobre o óbvio: há algo de muito podre no reino das apostas. Porém o que ainda parece invisível — ou convenientemente silenciado — é o verdadeiro jogo de bastidores.

Porque, sim, influenciadores têm responsabilidade. Mas e os clubes de futebol que vestem as marcas de apostas no peito, como troféu? E os aplicativos de delivery, transporte e redes sociais que permitem, promovem e até monetizam a publicidade de jogos de azar para públicos cada vez mais jovens? E os bancos digitais que permitem depósitos instantâneos para essas plataformas — muitas vezes, com recursos de origem questionável?

Estamos todos jogando. Só que alguns apostam, e outros lucram.

O artigo 4º do Código de Defesa do Consumidor fala em “educação e divulgação de informações sobre os produtos e serviços”. Onde está isso nas bets? Quando jovem de 17 anos, desempregado, aposta seu auxílio emergencial na promessa de dobrar o valor, onde estava o aviso sobre risco, vício e manipulação?

E pior: onde estava o Estado?

A evasão fiscal gerada por essas plataformas (operando via paraísos fiscais como Gibraltar e Malta) retira bilhões do país. Enquanto isso, teatros fecham, a educação pública sangra e a saúde respira por ajuda de aparelhos, dependendo de emendas parlamentares. As bets crescem – como uma sombra – fora da lei, fora da ética, fora do Brasil.

Não se trata de moralismo. Trata-se de responsabilidade.

Se continuarmos apontando dedos apenas para o influenciador do momento, vamos perder o foco do verdadeiro tabuleiro. O problema é estrutural, e os “jogadores” vão muito além da internet. O risco não é unicamente social ou econômico – é institucional.

Antes de declararmos uma influenciadora culpada, que tal perguntarmos: quem está patrocinando o vício no Brasil? E quem está ganhando com isso?

 *Aline Sena Barcellos é sócia do escritório Felicíssimo Sena e Advogados Associados, advogada especialista em Direito da Moda e Presidente da Comissão Especial de Direito da Moda da OAB-GO.

*Isabela Resende Calixto é graduanda em Direito pela PUC-GO e estagiária do escritório Felicíssimo Sena e Advogados Associados.