Jogos de azar ilegais responsabilizam os influenciadores digitais

Cícero Goulart e Byanca Barbosa*

A recente prisão da influenciadora Deolane Bezerra, em decorrência da operação “Integration”, que investiga uma organização criminosa envolvida com lavagem de dinheiro e prática de jogos ilegais, trouxe à tona uma discussão fundamental sobre a regulação dos jogos de azar no Brasil. Esta operação destacou não apenas a persistente ilegalidade dos jogos de azar no país, mas também a crescente responsabilidade dos influenciadores digitais na promoção e divulgação dessas práticas.

Embora a Lei Federal 14.790, sancionada em 29 de dezembro de 2023, tenha introduzido algumas modificações significativas, como a regulamentação das apostas por quota fixa, a prática de jogos de azar permanece considerada uma contravenção penal conforme o artigo 50 do Decreto-Lei 3.688/1941. Tal prática é punida com penas que podem variar de prisão simples de 15 dias a 3 meses, ou multa, podendo esta última alcançar até R$ 200 mil aos apostadores.

Mesmo com penas relativamente brandas, o impacto social e psicológico dos jogos de azar é devastador. Perda total de patrimônio e as suas consequências trágicas, incluindo a depressão e o suicídio, exigem uma resposta robusta do Estado. Nos últimos anos, observou-se um aumento alarmante na adesão aos serviços de apostas, em particular ao ‘gambling’, o qual é estritamente ilegal no Brasil.

Para uma melhor compreensão, é crucial distinguir entre as diferentes formas de jogos e apostas:

  • Gambling: Inclui jogos onde o resultado é majoritariamente determinado pelo acaso, como cassinos, roleta, blackjack e caça-níqueis. O caráter aleatório e a falta de controle fazem com que esses jogos sejam especialmente prejudiciais. Como exemplo temos o Fortune Tiger, mais conhecido como “Jogo do Tigrinho”.
  • Betting: Refere-se a apostas em eventos específicos, como esportivos ou culturais, onde a habilidade e o conhecimento podem influenciar o resultado. Embora possa envolver risco, não se baseia exclusivamente na sorte.
  • Gaming: Engloba jogos eletrônicos, onde habilidade e estratégia predominam. Embora alguns games possam oferecer prêmios, o principal objetivo é o entretenimento.

É importante destacar que tanto as casas de apostas quanto os praticantes de jogos de azar são passíveis de penalidades. No entanto, uma nova frente se abre para a responsabilidade dos influenciadores digitais que promovem essas atividades. Influenciadores como Carlinhos Maia, Deolane Bezerra e Virgínia Fonseca, ao promoverem plataformas de apostas, podem ser responsabilizados civil e criminalmente por seus atos.

Recentemente, foi proposta uma ação cível indenizatória na Comarca de Goiânia, Goiás, com a solicitação de R$ 1 milhão por danos morais e materiais contra uma casa de apostas e influenciadores digitais. A ação exige a apresentação de uma série de documentos e informações, incluindo contratos, históricos de apostas, controle de usuários e relatórios financeiros das atividades de apostas, especialmente para se comprovar que a Casa de Aposta dá chances reais de vitória aos apostadores e que os Influencers realmente jogam em suas plataformas, com resultados positivos e reais, não se constituindo apenas em propaganda enganosa.

Esse processo tem o potencial de iniciar um importante precedente na justiça brasileira, buscando reparar os danos causados às famílias devastadas pela perda de patrimônio em jogos de azar. Além disso, ressalta a necessidade urgente de um controle mais rigoroso das práticas de apostas e uma maior fiscalização sobre a promoção desses serviços.

A manipulação psicológica através de estratégias de marketing agressivas e a influência de figuras públicas sobre seus seguidores são questões que devem ser abordadas com seriedade. O uso da reputação de influenciadores para promover serviços ilegais não apenas agrava a responsabilidade desses profissionais, mas também demanda uma intervenção efetiva das autoridades.

O Estado Brasileiro deve adotar medidas mais contundentes para reprimir a prática ilegal dos jogos de azar e impedir sua divulgação nas mídias e redes sociais. A presença desses serviços em contextos como eventos esportivos e na publicidade deve ser combatida para proteger os consumidores e assegurar práticas justas e seguras no mercado.

Portanto, espera-se que as autoridades intensifiquem a fiscalização e regulamentação dos jogos de azar, minimizando os danos à sociedade e garantindo um ambiente de consumo mais seguro e transparente.

*Cícero Goulart é Conselheiro Seccional pela OAB/GO, advogado e sócio fundador da Goulart Advocacia, especialista em Direito do Consumidor, Digital, Processual Civil e Constitucional, e Membro Consultor da Comissão de Direito do Consumidor do Conselho Federal da OAB – @cicerogoulart.adv 

*Byanca Barbosa é advogada integrante da Goulart Advocacia – @byancabarbosaa