Incorporação imobiliária de supercondomínios e condomínios multiuso

*Bianca Viana

Este artigo explora os aspectos legais, urbanísticos e operacionais desses empreendimentos, destacando as regulamentações envolvidas e os desafios na integração de usos diversos em espaços urbanos.

  1. Introdução:

O avanço do mercado imobiliário está intrinsecamente ligado ao desenvolvimento das cidades e às preferências do consumidor, com o intuito de buscar práticas urbanísticas sustentáveis. Nesse contexto, a incorporação de supercondomínios e condomínios multiuso emerge como uma solução para otimizar o uso do solo e criar comunidades mais integradas.

  1. Conceito:

Os condomínios multiuso são empreendimentos multifacetados com destinação de uso misto, abrangendo usos residenciais, comerciais e de lazer, todos desenvolvidos no mesmo local e por meio de uma única incorporação.

Por outro lado, os supercondomínios, além da destinação de uso misto, permitem o desenvolvimento do empreendimento por fases, onde a aprovação do projeto urbanístico ocorre integralmente, mas a construção e lançamento ocorrem por etapas. Essa modalidade permite o desenvolvimento de empreendimentos caracterizados como “Bairros Planejados”, divididos em setores que beneficiam toda a população, permitindo a coexistência harmoniosa de residentes, trabalhadores e visitantes.

  1. Aspectos legais:

O início de qualquer incorporação imobiliária está condicionado à apresentação, perante o registro de imóveis competente, do rol de documentos previsto no artigo 32 da Lei 4.951/64, dentre eles destaca-se a convenção de condomínio e o memorial de incorporação.

No que tange à incorporação imobiliária de empreendimentos complexos, é de extrema importância observar o disposto no art. 8º da Lei 4.591/64, que trata sobre o conjunto de edificações:

Art. 8º Quando, em terreno onde não houver edificação, o proprietário, o promitente comprador, o cessionário deste ou o promitente cessionário sobre ele desejar erigir mais de uma edificação, observar-se-á também o seguinte:

  1. a) em relação às unidades autônomas que se constituírem em casas térreas ou assobradadas, será discriminada a parte do terreno ocupada pela edificação e também aquela eventualmente reservada como de utilização exclusiva dessas casas, como jardim e quintal, bem assim a fração ideal do todo do terreno e de partes comuns, que corresponderá às unidades;
  2. b) em relação às unidades autônomas que constituírem edifícios de dois ou mais pavimentos, será discriminada a parte do terreno ocupada pela edificação, aquela que eventualmente for reservada como de utilização exclusiva, correspondente às unidades do edifício, e ainda a fração ideal do todo do terreno e de partes comuns, que corresponderá a cada uma das unidades;
  3. c) serão discriminadas as partes do total do terreno que poderão ser utilizadas em comum pelos titulares de direito sôbre os vários tipos de unidades autônomas;
  4. d) serão discriminadas as áreas que se constituírem em passagem comum para as vias públicas ou para as unidades entre si.

Além disso, a legislação permite que o empreendedor efetue o desdobramento em várias incorporações, possibilitando o fracionamento em etapas ou fases para o lançamento e execução das obras, de acordo com o artigo 6º da Lei 4864/65:

Art. 6º – No caso de um conjunto de edificações a que se refere o artigo 8º da Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964, poder-se-á estipular o desdobramento da incorporação em várias incorporações, fixando a convenção de condomínio ou contrato prévio, quando a incorporação ainda estiver subordinada a períodos de carência, os direitos e as relações de propriedade entre condôminos de várias edificações.

Ademais, destaca-se que o faseamento do empreendimento permite a expedição do “habite-se” de forma parcial após a conclusão de cada etapa, com a respectiva instituição do condomínio.

  1. Aspetos urbanísticos:

O desenvolvimento desses empreendimentos deve atender às exigências e limitações da legislação municipal, que frequentemente requerem a revisão das regulamentações de zoneamento e uso do solo, envolvendo a análise e adaptação das leis locais por profissionais do Direito Urbanístico.

Importando ressalvar, sobretudo, quanto aos critérios urbanísticos de taxas de ocupação, coeficiente de aproveitamento de lote e altura das construções. Também é possível a utilização da Outorga Onerosa do Direito de Construir e a Alteração de Uso do Solo pelo ente púbico, que consiste em contrapartida financeira permitida para a realização de alterações nos índices urbanísticos definidos pelo Plano Diretor.

Diante disso, importante ressaltar que a incorporação bem-sucedida de supercondomínios e condomínios multiuso requer colaboração entre uma variedade de partes interessadas, incluindo desenvolvedores e autoridades municipais, bem como, a interligação de arquitetos e demais profissionais com os advogados responsáveis pela na estruturação jurídica do empreendimento.

  1. Operação do Condomínio:

Os supercondomínios e condomínios multiuso são objeto de desafios jurídicos não somente para as aprovações legais, mas também para a operação desses empreendimentos. Nesse contexto, é importante destacar a elaboração de contratos e regulamentos internos com soluções para a administração do empreendimento, que, em regra, envolvem a figura dos subcondomínios, com determinadas autonomias entre si.

Assim, a elaboração da convenção de condomínio regulamenta a administração do condomínio como um todo, mas é possível estabelecer que cada subcondomínio possua administração independente, de acordo com as especificidades de cada setor do empreendimento.

  1. Benefícios e Impacto Urbanístico:

Esses empreendimentos desempenham um papel relevante no contexto de cidades inteligentes e conectadas, contribuindo para a sustentabilidade, uma vez que maximizam o aproveitamento do espaço urbano, reduzindo a expansão descontrolada das cidades e a concentração de atividades em um mesmo local, o que reduz a necessidade de deslocamentos, economizando recursos e diminuindo a emissão de poluentes, aspectos esses que podem ser objeto de regulamentações ambientais específicas.

Além disso, oportuniza a criação de comunidades mais integradas, onde residências, trabalho e lazer coexistem, levando em consideração aspectos de convivência e normas de regulamentos internos.

  1. Conclusão:

A incorporação de supercondomínios e condomínios multiuso é crucial para o desenvolvimento urbano, proporcionando benefícios substanciais, mas também enfrentando desafios complexos em termos de regulamentações legais e urbanísticas. À medida que as cidades continuam a evoluir, é fundamental considerar esses aspectos para garantir o planejamento e a implementação bem-sucedidos desses empreendimentos.

  1. Referências:

BRASIL. Lei n. 4591, de 16 de dezembro de 1964. Dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias. Disponível em: http://www.planalto.gov. br/ccivil_03/leis/L4591.htm Acesso em: 23/10/2023.

BRASIL. Lei n. 4864, de 29 de novembro de 1965. Cria Medidas de estímulo à Indústria de Construção Civil. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4864.htm.

BORGES, Marcus Vinícius Motter, coordenador. Curso de direito imobiliário brasileiro – 2 ed. rev., atual e ampl. – São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2022.

*Bianca Viana é advogada associada ao Dias & Amaral Advogados Associados, com atuação no âmbito Cível e Imobiliário, nas diversas operações do segmento envolvendo Loteadoras, Imobiliárias, Incorporadoras e Construtoras. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Pós-Graduada em Direito Civil e Processo Civil pela Faculdade Atame. Pós-Graduada em Direito Imobiliário pelo Complexo de Ensino Renato Saraiva. Membro da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB/GO, triênio 2022/2024. Membro da Comissão Especial de Direito Condominial da OAB/GO, triênio 2022/2024. Coordenadora do Núcleo de Direito Imobiliário, Urbanístico e Condominial/IEAD. Associada ao Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário – IBRADIM.