Entenda a bilateralidade da multa contratual na compra e venda de grãos

*Mayra Esmeralda Brandão de Sá

No intuito de escoar eficientemente as safras produzidas, os produtores rurais buscam realizar negócios jurídicos com as grandes empresas do agronegócio, as quais viabilizam o processamento, a comercialização e a exportação dos grãos.

Em sua maioria, os instrumentos contratuais são elaborados unilateralmente pelas empresas adquirentes dos produtos. Assim, por vezes, observa-se que as cláusulas  são estruturadas para favorecer às referidas empresas (compradoras), em detrimento dos produtores rurais (vendedores).

Neste panorama, é comum deparar-se com contratos que estabelecem multa pecuniária apenas para as hipóteses em que o produtor rural descumpre as obrigações pactuadas.

No entanto, como regra, os contratos civis e empresariais se tratam de instrumentos “paritários” e “bilaterais”. Isso significa dizer que a imposição da multa contemplando hipóteses de inadimplência cometida por uma das partes, apenas, está cravejado de ilicitude.

Isto porque, contraria o Código Civil, em seu artigo 409 conjugado com o artigo 411, quando especifica que a inexecução do contrato, ou simplesmente a sua mora, enseja a aplicação da multa pecuniária. Assim, poderá o produtor rural exigir tanto a satisfação da obrigação avençada quanto o pagamento da multa, cumulativamente. 

A proteção do produtor rural advém, ainda, da necessidade de observar-se a boa-fé contratual, nos casos em que seja necessário interpretar o negócio jurídico, à luz da vontade das partes, nos termos do artigo 113 do Código Civil e conforme esclarece Silvio de Salvo Venosa[1]:

“A interpretação do negócio jurídico em geral, e a do contrato particular, situa-se na fixação do conteúdo, compreensão e extensão e da elaboração da vontade”.

Diante disso, ainda que os contratos de compra e venda de grãos imponham multas a serem arcadas exclusivamente pelos produtores rurais, as empresas adquirentes dos produtos também deverão assumir tal ônus, caso descumpram o negócio jurídico.

*Mayra Esmeralda Brandão de Sá é pós-draduada em Direito Ambiental. Advogada do escritório Silva Freire Advogados. @sfreireadvogados e @mayrabrandaoadvogada

[1] VENOSA, Silvio de Salvo; Direito Civil: Contratos / Silvio de Salvo Venosa – 17ª Edição – (Coleção Direito Civil; Volume 3) – São Paulo: Atlas, 2017.