O estudo das teorias macrossociológicas de ordem consensual e sua relação com o Direito Penal Moderno revela como normas e valores sociais são incorporados ao sistema penal. Fundamentadas no funcionalismo estrutural, essas teorias postulam que a estabilidade social resulta do consenso coletivo sobre valores e regras, tornando o Direito Penal um reflexo das conquistas morais de uma sociedade. Mais do que um instrumento de punição, o sistema penal também reforça valores fundamentais, promovendo coesão e justiça.
Para entender essa interseção, é essencial considerar o contexto histórico e social em que tais teorias surgiram. No século XX, com o avanço das ciências sociais, cresceu a necessidade de compreender a sociedade de forma ampla, analisando tanto a coesão social quanto a função reguladora do sistema jurídico. Inspirado por pensadores como Émile Durkheim, o pensamento de ordem consensual defende que as normas criminais emergem do consenso social, garantindo a estabilidade mesmo diante da diversidade e das complexidades modernas.
As teorias macrossociológicas analisam os fenômenos sociais em larga escala, investigando como diferentes elementos interagem para manter ou transformar a ordem social. Diferente das abordagens microsociológicas, focadas em interações individuais, essas teorias examinam mecanismos coletivos, como instituições e normas culturais. Dessa forma, ajudam a entender padrões de comportamento e mudanças estruturais em sociedades contemporâneas.
A ordem consensual, dentro desse arcabouço teórico, representa um estado de harmonia social alcançado por meio do entendimento e aceitação coletiva de normas e valores. Em contraste com sistemas baseados em coerção, a ordem consensual emerge de um diálogo contínuo, onde as normas são ajustadas conforme as necessidades sociais. Esse modelo promove a coesão através da cooperação voluntária, reduzindo a necessidade de intervenções coercitivas típicas de sistemas hierárquicos.
O Direito Penal Moderno evoluiu em resposta a transformações sociais, políticas e econômicas, especialmente com a influência do Iluminismo, que pregava racionalidade, igualdade e direitos fundamentais. Autores como Cesare Beccaria, em Dos Delitos e das Penas, criticaram penas desproporcionais e defenderam um sistema pautado na prevenção e na proporcionalidade. Assim, o Direito Penal passou a priorizar legalidade, culpabilidade e individualização da pena, afastando-se da arbitrariedade medieval.
Historicamente, as penas tinham um caráter vingativo, refletindo sociedades pautadas na honra e na reparação pessoal. Com o avanço da codificação no século XIX, como o Código Napoleônico, houve um movimento de racionalização das normas penais. O Direito Penal Moderno busca equilibrar interesses individuais e coletivos, adaptando-se às transformações culturais e políticas de cada época, o que exige revisões constantes dos códigos penais.
As teorias macrossociológicas de ordem consensual ajudam a compreender o papel do Direito Penal na sociedade contemporânea. O sistema penal, longe de ser apenas um instrumento de repressão, também preserva a ordem social ao estabelecer limites e sancionar condutas que ameaçam o consenso coletivo. Nesse sentido, as sanções penais não visam apenas punir, mas também ressocializar os indivíduos, promovendo a estabilidade social.
O tema de hoje se relaciona diretamente com a Agenda 2030 da ONU, que propõe um novo olhar sobre a criminalidade, considerando um contexto globalizado que exige cidadãos mais participativos e conscientes de seus direitos e deveres. O Direito Penal do futuro deve ser mais humanizado, sensível às necessidades individuais e sociais. Como bem expressou Eugenio Raúl Zaffaroni, em Direito Penal Humano e Poder no Século XXI: “Não é possível controlar e criticar a distribuição do pão sem liberdade; inversamente, se a liberdade for concedida sem pão, ela será usada para reivindicá-la”. Essa reflexão reforça a necessidade de um Direito Penal que equilibre justiça e humanismo, garantindo um futuro mais equitativo para todos.
*Marcelo Bareato é doutorando em Direito Público pela Universidade Estácio de Sá/RJ, ocupa a cadeira de n.º 21 na Academia Goiana de Direito, professor de Direito Penal, Processo Penal, Legislação Penal Especial, Direito Internacional Público, Relações Humanas, Criminologia e Execução Penal na PUC/GO e na EBPÓS – Escola Brasileira de Pós Graduação, Conferencista, Parecerista, Advogado Criminalista, Presidente do Conselho de Comunidade na Execução Penal de Goiânia/GO, Vice Presidente da ABRACRIM/GO – Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas – Seccional Goiás, Membro da Comissão de Direitos Humanos da Seccional OAB/GO, Membro da Coordenação de Política Penitenciária da OAB/Nacional, Membro do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura/GO, Coordenador da Comissão Intersetorial de Acompanhamento da Saúde no Sistema Prisional/GO, Membro do FOCCO – Fórum Permanente de Combate à Corrupção do Estado de Goiás, Membro da ABA – Associação Brasileira dos Advogados, Membro da AASP – Associação dos Advogados do Estado de São Paulo/SP, Membro do IBCcrim – Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, Membro do Instituto Ibero-americano de Compliance, entre outros (ver currículo lattes http://lattes.cnpq.br/1341521228954735).