Kelly Luisa*
Sabendo da vulnerabilidade das transações que envolvem contratos de empréstimos consignados, evidenciadas pelas inúmeras ocorrências de fraudes em todo o país, a lei é clara sobre o fato de que as instituições financeiras assumem o risco do negócio. Devendo, portanto, restituir em dobro, com acréscimos legais os valores cobrados indevidamente, nos termos do art. 42, § único do Código de Defesa do Consumidor, sendo assim, aqui será enfatizado valores subtraídos indevidamente de benefício previdenciário dos aposentados.
Vejamos um exemplo clássico: João, aposentado pelo Regime Geral da Previdência Social recebe uma renda mensal irrisória. Mensalmente um salário mínimo, passando longe do teto, vive no limite financeiro, a fim de tentar suprir as necessidades de sua família, sendo esposa, netos e filhos (realidade no Brasil). Assim, o que recebe a titulo de aposentadoria é direcionado a suprir gastos com o básico, ou seja, alimentação, tratamento médico e medicamentos. É doente, aposentado por invalidez. Beneficio este que, com a reforma da Previdência, que está em vigor desde 13 de novembro de 2019, passou a se chamar ‘Benefício por Incapacidade Permanente’.
Perplexo e com tamanha indignação ao descobrir o motivo, vem recebendo sua aposentadoria com descontos indevidos. O que deveria ser um salário mínimo passa a ser menos que a metade, valores estes que descobre foram subtraídos ilegalmente de sua aposentadoria em favor de instituições bancárias.
Diante deste fato, e por dificuldade em obter informações, afinal, é semianalfabeto, não sabe ler e pouco escreve, peregrinou por muito tempo batendo a portas de instituições bancarias e da autarquia federal (INSS) antes de chegar a uma (um) especialista, na tentativa de solucionar o problema sozinho, que foi em vão.
O ´x´ da questão é: há inúmeros registros de empréstimos consignados junto a instituições bancarias, um realmente feito por ele e outros tantos desconhecidos, não contratados. E com descontos em folhas de pagamento junto a Autarquia Federal – INSS, inúmeras parcelas já descontadas indevidamente e com previsão de findar a perder de vista. Sendo este, o prejuízo material, que data máxima vênia, deverá ser restituído ao aposentado em dobro e com correção monetária.
Desvendando foi para o aposentado o mistério de seu beneficio estar com valor abaixo, há contratos de empréstimos consignados junto a instituições bancarias em seu nome, e através de perícia grafotécnica foi constatado que as assinaturas não são de seu próprio punho, portanto, falsas. Desconhece referidos contratos por não ter celebrado e muito menos assinado, nunca aconteceu de seu documento pessoal ter sido furtado ou extraviado e, portanto, foi vítima de fraudes.
Diante de pouca instrução que possui, com a condição de idoso e recebendo descontos de empréstimos fraudulentos se vê impossibilitado da manutenção do básico, como alimentos e medicamentos, através do único recurso financeiro que garante a sua subsistência. Na verdade, nada deve para essas instituições ante a inexistência de celebração dos contratos, não restando alternativa a ele senão bater as portas do judiciário visando restabelecer o que lhe é de direito e justiça.
Assim, resta claro, que a autorização de empréstimo consignado sem anuência e assinatura de aposentados beneficiários do INSS, utilizando seus dados e posteriores lançamentos em seus benefícios, que a prestação do serviço pelas instituições bancárias e a autarquia federal é por demais deficiente, pois deixam de exercer com o zelo necessário este tipo de transação.
Nesta seara, se faz necessário a ‘inversão do ônus da prova’, aos moldes dos Artigos 3º, § 2º e 6º, inciso VIII da Lei nº. 8.078/90, dada à relação de consumo (direito do consumidor) existente e o estado de hipossuficiência da vítima que, na maioria das vezes resta provado, para que as instituições demonstrem e comprovem de forma robusta e verossímil a efetiva existência, legitimidade e autenticidade dos contratos de empréstimos consignados então guerreados, assim como da suposta dívida deles decorrentes.
No que tange ao direito ao dano moral, é reconhecido pela Constituição Federal. Assegurando a Carta o direito à indenização em caso de sua violação, conforme se infere do cristalino comando normativo esculpido no artigo 5º, Inciso X. Impende salientar ainda a cumulatividade dos danos material e moral, consoante a jurisprudência sumulada do Colendo Superior Tribunal de Justiça: “são cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundo do mesmo fato”.
As atividades de concessão de empréstimo consignado ao INSS, exercidas por instituições financeiras, estão sujeitas à Instrução Normativa do INSS. Assim sendo, há de convir que é inadmissível que as instituições bancarias e a autarquia federal, no exercício dos seus serviços, com setor específico e pessoas em tese, bem treinadas para realização de contrato de empréstimo consignado, não cumpram com seu mister de maneira eficiente. E principalmente, com o devido zelo, causando prejuízos morais e materiais, bem como, transtornos de grande monta, sério e grave abalo emocional, quando são tirados dos aposentados o poucos recursos de que dispõem, obrigando-os a recorrerem a amigos e parentes para complementarem a renda a fim de manterem o sustento próprio e de suas famílias.
Ao debutarmos neste item, torna-se indispensável mencionar que a conduta destes tem causado diversos dissabores, estando, pois, inseridas no contexto do dano moral, passível de indenização, segundo os ditames do ordenamento pátrio.
O dano moral quando pleiteado derivada da diminuição da capacidade financeira da vitima, bem como o constrangimento de ver descontado de seu benefício previdenciário quantia que não contratou e as consequências daí derivadas, como a peregrinação na tentativa de solucionar o caso.
É neste sentido que uma condenação é imperiosa que seja cumulativa, não pode e nem deve ser simbólica, irrisória, pois se assim for, estar-se-ia desviando da essencial finalidade da condenação por danos morais, qual seja, o desestímulo a que fatos como estes se repitam.
*Kelly Luisa é advogada, sócia proprietária no escritório Luisa e Oliveira Advogados Associados, possui atuação especializada em Direito Previdenciário/INSS e defesa dos direitos do consumidor contra instituições financeiras, empresas e bancos, com foco em ações judiciais envolvendo fraudes em empréstimos. Atuação especializada a favor do consumidor nas ações de reparação de danos (material e moral). Graduada há 16 anos. Pós-graduada em Direito Civil. Processo Civil e Direito Previdenciário. Membro das Comissões de Direito Previdenciário e Direito do Consumidor do Estado de Goiás. Atendo on-line todo o Brasil e Brasileiros no exterior Atendo pessoalmente em Goiânia – Goiás. Instagram @kellyluisa.adv – Email: kellyluisajur@gmail.com
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
Código de Defesa do Consumidor: Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, atualizada.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988.
Jurisprudência sumulada do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
Instrução normativa do INSS/PRES n. 138 de 10 de novembro de 2022.