
Karine de Faria Alves*
O acesso à saúde é um direito garantido pela constituição brasileira, mas sua efetivação enfrenta diversos obstáculos, tanto estruturais quanto operacionais. Neste cenário, a judicialização da saúde surge como um fenômeno cada vez mais presente, evidenciando a busca dos cidadãos por uma solução legal para garantir seus direitos associados à saúde. Este processo, apesar de necessário em muitos casos, levanta questões importantes sobre sua influência nas políticas públicas de saúde e na alocação de recursos. Portanto, compreender o papel desempenhado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na orientação e na coordenação dos esforços para enfrentar esse desafio torna-se essencial para formular estratégias mais eficazes e equitativas de acesso à saúde.
Este artigo busca explorar a atuação do CNJ frente à judicialização da saúde, abordando suas iniciativas para mediar o diálogo entre os diversos atores envolvidos e para propor soluções que visem o equilíbrio entre a garantia do direito à saúde e a sustentabilidade das políticas públicas. Será analisado o panorama da judicialização da saúde, seguido de uma discussão detalhada sobre as estratégias adotadas pelo CNJ para mitigar os impactos desse fenômeno. Além disso, avaliaremos o impacto dessas políticas coordenadas pelo CNJ, culminando com reflexões sobre os caminhos futuros para o acesso a saúde no Brasil. Este passeio pelos meandros da interface entre justiça e saúde pública promete trazer insights valiosos para acadêmicos, profissionais da área e para todos aqueles comprometidos com a melhoria do acesso à saúde no país.
Judicialização da Saúde: um panorama
Dados e Estatísticas
Mais de 520 mil processos judiciais relacionados à saúde estão em tramitação na Justiça brasileira, segundo o Painel de Estatísticas Processuais de Direito da Saúde do CNJ. Entre 2020 e 2022, foram ingressadas 89 mil novas ações sobre saúde pública e 50 mil sobre saúde suplementar [1]. Em 2022, identificou-se cerca de 460 mil novos processos judiciais, com 164 mil sobre saúde suplementar [2]. O índice de Atendimento à Demanda, que mede o número de processos julgados comparado aos recebidos, foi de 108,6% em maio de 2022, indicando que mais processos foram julgados do que novos casos recebidos [1].
Principais Demandas
As principais questões judicializadas envolvem o fornecimento de medicamentos, tratamento médico-hospitalar, reajuste contratual e leitos hospitalares [1] [2].
A saúde suplementar foi destacada como o principal alvo das ações, com um aumento de 19,86% em novos casos entre 2021 e 2022 [3]. Além disso, a negativa de cobertura assistencial é a principal causa de litígio envolvendo operadoras de planos de saúde, representando mais da metade do total de decisões nas duas instâncias [4].
CNJ e Suas Iniciativas
Programas Implementados
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem desenvolvido programas significativos para abordar a judicialização da saúde. Um destes é o projeto “Judicialização e Sociedade”, que realiza levantamentos de dados sobre demandas judiciais relacionadas à saúde, em cooperação com Comitês Executivos locais nos estados. Essa iniciativa busca compilar informações tanto dos registros do Poder Judiciário quanto dos órgãos gestores de saúde, visando a criação de estratégias para solucionar os conflitos mais recorrentes [5].
Parcerias e colaborações
Em uma colaboração notável, o CNJ, juntamente com o Ministério da Saúde e o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), apoiado pela Organização Pan-americana de Saúde (OPAS), concluiu um projeto para a elaboração de 150 Notas Técnicas de Avaliação de Tecnologias em Saúde. Essas notas visam auxiliar magistrados na tomada de decisões sobre casos judicializados no Sistema Único de Saúde (SUS) [6]. Além disso, a integração da Confederação Nacional da Saúde (CNSaúde) ao Fórum Nacional do Judiciário pela Saúde (Fonajus) reforça a dinâmica de trabalho em rede, integrando o Sistema de Justiça e o Sistema de Saúde para qualificar as decisões judiciais [6].
Impacto das políticas públicas coordenadas pelo CNJ
Efeito na gestão da saúde pública
A implementação de políticas públicas pelo CNJ tem mostrado um forte impacto na gestão da saúde pública, especialmente na redução da judicialização de casos envolvendo tecnologias não incorporadas ao SUS. Segundo o juiz Gerardo Silva Júnior, a falta de diálogo e conhecimento sobre os impactos sociais dessas ações são críticos e necessitam de uma abordagem mais informada e responsável [7]. Além disso, a colaboração entre o CNJ e o Ministério da Saúde tem facilitado a definição de prazos mais razoáveis para a entrega de medicamentos, contribuindo para uma resposta mais eficaz às necessidades dos cidadãos [7].
Opiniões de especialistas
Especialistas em saúde têm enfatizado a necessidade de uma avaliação mais criteriosa das decisões judiciais na saúde. Munir Murad Júnior, por exemplo, destaca a importância de apresentar expectativas realistas aos pacientes, considerando os diferentes tratamentos e suas aplicabilidades [7]. Outro aspecto relevante levantado por especialistas é o equilíbrio entre custo e benefício dos tratamentos, criticando a influência da indústria farmacêutica na elevação dos custos sem necessariamente oferecer melhores resultados [7]. Essas opiniões reforçam a necessidade de uma gestão mais integrada e baseada em evidências científicas para melhorar as políticas de saúde pública.
Conclusão
Ao longo deste artigo, exploramos a complexidade da judicialização da saúde no Brasil e o papel crucial desempenhado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na busca de soluções que harmonizem os direitos dos cidadãos à saúde com a sustentabilidade das políticas públicas. Discernimos como o CNJ atua firmemente para criar diálogos entre diferentes esferas e promover inovações, como a elaboração de notas técnicas e a formação de parcerias estratégicas, que visam embasar melhor as decisões judiciais e otimizar a gestão da saúde pública.
Essas estratégias refletem um calendário dedicado à maximização dos recursos e à diminuição do fosso entre a necessidade e o acesso efetivo à saúde, tornando-se um farol de direção para futuras políticas e ações. A incorporação do conhecimento tecno- científico nas decisões judiciais e a colaboração entre os poderes Judiciário e Executivo indicam um caminho promissor para a minimização dos conflitos entre direito à saúde e economia. Assim, convidamos os envolvidos em todos os níveis – seja no design de políticas, na prática jurídica ou na gestão da saúde – a seguir esses insights e trabalhar conjuntamente para facilitar um acesso justo e eficaz à saúde no Brasil.
FAQs
1. Qual a principal função do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no Brasil?
O CNJ atua primordialmente na melhoria do sistema judiciário brasileiro, enfocando o controle e a transparência tanto administrativa quanto processual.
2. O que é a judicialização da saúde e como ela ocorre?
A judicialização da saúde acontece quando indivíduos buscam na justiça o acesso a tratamentos ou medicamentos não disponibilizados de forma padrão pelo Sistema Único de Saúde (SUS) ou que estejam em falta, exigindo que o Poder Público forneça esses serviços.
3. Quais são as responsabilidades do CNJ dentro do Poder Judiciário brasileiro?
O CNJ é encarregado de gerenciar o controle administrativo e financeiro, além de observar os deveres funcionais dos juízes dos cinco ramos do Judiciário nacional, com exceção do Supremo Tribunal Federal (STF). Sua função inclui também planejar, apoiar e monitorar políticas para aprimorar os serviços judiciários.
4. Quais são as consequências da judicialização da saúde para o sistema de saúde no Brasil?
A judicialização da saúde provoca uma desestabilização na alocação de recursos públicos destinados às políticas de saúde, criando um desequilíbrio nas relações entre os Poderes devido ao aumento de ações judiciais que demandam medicamentos e tratamentos de saúde.
*Karine de Faria Alves é mestranda em Resolução de Conflitos, Mediação e Conciliação, pós-graduada em Saúde Pública e MBA em Gestão Empresarial, conselheira empresarial, graduada em Enfermagem e graduanda em Direito pela ESUP, pós-graduanda em Direito Médico e Saúde e Planejamento e Soluções Tributária em Negócios de Saúde, e-mail: karinedefariaalves@gmail.com.
Referências
- – https://www.cnj.jus.br/dados-processuais-de-saude-podem-ser-monitorados-em-painel-do-cnj/
- – https://www.cnj.jus.br/saude-suplementar-pontua-impacto-de-processos-judiciais-para-equilibrio-do-setor/
- – https://futurodasaude.com.br/aumento-judicializacao-na-saude/
- – https://rededepesquisa.fgv.br/noticia/mais-de-100-mil-demandas-judiciais-sobre-planos-de-saude-sao-coletadas-e-analisadas-em
- – https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/forum-da-saude-3/judicializacao-e-sociedade-acoes-para-acesso-a-saude-publica-de- qualidade/
- – https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/forum-da-saude-3/judicializacao-e-sociedade-acoes-para-acesso-a-saude-publica-de- qualidade/
- – https://www.cnj.jus.br/especialistas-avaliam-impacto-de-decisoes-judiciais-sobre-tecnologias-nao-incorporadas-ao-sus/