A necessária evolução da dogmática dos precedentes no Brasil

*Carolina Teles Carvalho

É possível observar no Brasil, país que historicamente se filia ao sistema romano-germânico, a recepção de influências do sistema anglo-americano, o que é claramente perceptível a partir do Código de Processo Civil de 2015, especialmente no que tange à idealização de uma sistemática de precedentes.

Nessa perspectiva, o Diploma Processual dispõe em seu artigo 927 uma série de provimentos judiciais que necessariamente devem ser observados pelos juízes e tribunais: (I) decisões do STF em controle abstrato de constitucionalidade; (II) os enunciados de súmula vinculante; (III) os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; (IV) os enunciados do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do STJ em matéria infraconstitucional; e (V) a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.

Importante destacar, conforme lição de Arthur José Jacon Matias, que na tradição anglo-americana os juízes estão sujeitos a acatar aos padrões normativos prescritos por decisões antecedentes (prior cases), elaboradas através dos próprios magistrados, ainda que não concordem com essas decisões, ao passo que o magistrado da tradição romano-germânica não está vinculado aos “precedentes judiciais”, mesmo que estes sejam originados em tribunais superiores[2].

Essa concepção foi temperada em nosso ordenamento jurídico, em virtude do já referido artigo 927, do Código de Processo Civil. Em que pese ainda se discuta qual seria o grau de observância dos magistrados em relação aos precedentes listados no referido dispositivo legal, é possível se depreender que há um dever dos juízes de examinar a situação fática colocada juízo sem desprezo, além da legislação positivada, dos precedentes e súmulas antes mencionados. Surge então a necessidade de a dogmática jurídica desenvolver, de forma apropriada a realidade brasileira, as técnicas avançadas de distinção (distinguishing) ou superação (overruling) de precedentes.

*Carolina Teles Carvalho é a assistente jurídica.

Referências

[1] MATIAS, Arthur José Jacon. Precedentes: fundamentos, elementos e aplicação. Leme (SP): JH Mizuno, 2019, p. 19.