A importância do gerenciamento adequado do passivo trabalhista das empresas brasileiras

Flávio Ferreira

O presente artigo trata da importância da adoção de um bom gerenciamento do passivo trabalhista nas empresas brasileiras, e como falhas nos atuais modelos de gestão podem criar “passivos ocultos” difíceis de administrar. Entendo que aprimorar os critérios de avaliação pode significar para o empresário a diferença entre o lucro e o prejuízo no seu negócio.

Que os processos trabalhistas aguilhoam severamente as empresas e impactam significativamente os seus resultados financeiros, não é nenhuma novidade, porém, tentarei demonstrar como falhas nos critérios atuais de avaliação do passivo trabalhista das empresas estão criando riscos significativos para os negócios. De fato, nos métodos de avaliação usualmente empregados, as contingências trabalhistas são levadas em conta, apenas quando devidamente conhecidas, porém, estudos empíricos sobre o assunto indicam que o passivo oculto – portanto, não contabilizadosuplanta facilmente o passivo identificado nas auditorias comuns. E isso é algo muito sério.

Para compreender a dimensão do risco para empresas com gestão trabalhista ineficiente, vou demonstrar como uma irregularidade infelizmente muito comum pode criar grande passivo trabalhista “oculto”, com potencial de impactar significativamente, ou até mesmo, desestabilizar financeiramente o negócio.

Trata-se de uma reclamação trabalhista individual na qual o obreiro, dentre outros pedidos, requeria o pagamento de indenização por dano moral, alegando que trabalhava no Setor de Recebimento e Expedição de Produtos de uma empresa de pequeno porte, juntamente com outros vinte e três funcionários, e que para uso de todos a reclamada disponibilizava apenas um banheiro, composto de vaso sanitário mal conservado e sujo, um chuveiro com uma cortina rasgada para a vedação, além de uma pia, sendo que a limpeza e a higienização do local não eram feitas de maneira habitual. Após diligência pericial, o “Expert” confirmou as alegações do reclamante e emitiu um laudo concluindo que efetivamente o meio ambiente de trabalho encontrava-se em total desacordo com as disposições contidas na NR-24 da Portaria 3214. Em primeira instância a empresa foi condenada a pagar ao reclamante uma indenização de R$ 8.000,00 por comportamento ofensivo à dignidade do trabalhador. A sentença foi confirmada na segunda instância.

A partir deste ponto surge uma situação “sui generis”. Desprovido o recurso, se a direção da empresa simplesmente contabilizar o valor da condenação de R$ 8.000,00 no seu passivo corrente, acreditando que “virou a página”, estará cometendo grave equívoco, tendo em vista que após a sentença condenatória, na verdade o seu real passivo trabalhista ficou oculto, e será incomparavelmente maior. De fato, por sua negligência em cumprir as disposições estabelecidas na NR-24, que regulamenta as condições sanitárias e de conforto nos locais de trabalho, a reclamada foi condenada a pagar ao reclamante uma indenização por dano moral no valor de R$ 8.000,00. Ora, além dele, outros vinte e três funcionários também trabalhavam no mesmo ambiente, expostos as mesmas condições, e, portanto, tendo direito a percepção de igual indenização, bastando apenas que a postulem em juízo. Em outras palavras, para evitar surpresas desagradáveis no futuro, a empresa deveria provisionar o valor de R$ 184.000,00 para fazer frente a esse passivo oculto, que a qualquer momento poderá se materializar em passivo corrente.

A diferença entre o passivo emergente de uma reclamação trabalhista e o passivo que pode ficar oculto é impressionante, e de certa maneira explica o motivo de tantos negócios promissores, após uma espiral insana de demandas, ficarem insolventes. A boa notícia é que é possível rastrear, identificar e corrigir essas falhas sistêmicas antes que se tornem verdadeiramente um problema para o negócio.

Empresas de todos os tamanhos e ramos de atividade podem e devem se beneficiar de uma auditoria preventiva especializada. O bom gerenciamento do passivo trabalhista traz inegáveis vantagens competitivas, pois além da significativa redução de custos, a melhoria do meio ambiente de trabalho terá reflexos na produtividade e na gestão da empresa, influenciando diretamente no faturamento. Ademais, tais atributos serão vitrine para atrair investidores, já que eles certamente vão priorizar as empresas que além de oferecerem menos riscos, também tragam o melhor retorno para o seu capital.

*Flávio Ferreira é  consultor na prevenção e correção de riscos ocupacionais –  www.linkedin.com/in/flávio-ferreira-a9698a30