Quem tem antecedente criminal pode prestar concurso público? Entenda de forma clara seus direitos

Uma das dúvidas mais comuns entre candidatos a concursos públicos, principalmente quando chega a etapa da investigação social, é se quem tem antecedente criminal pode participar de concurso público. Afinal, quem já teve alguma passagem pela polícia, responde a um processo criminal, ou até mesmo já foi condenado, pode ser impedido de tomar posse?

A verdade é que essa resposta depende de uma série de fatores. E se você já se viu nessa situação, é essencial saber: existe sim a possibilidade de continuar concorrendo, e até mesmo tomar posse, dependendo do seu caso.

Neste artigo, vamos esclarecer ponto a ponto, com base na legislação, em decisões do STF e do STJ, além de práticas comuns das bancas examinadoras.

1. Ter antecedente criminal impede de prestar concurso público?

Não, ter antecedente criminal por si só não impede a inscrição em concursos públicos. O que pode gerar impedimento, em alguns casos, é a existência de uma condenação definitiva (transitada em julgado).

Enquanto não houver decisão judicial final, ou seja, enquanto houver possibilidade de recurso, o candidato não pode ser considerado culpado, conforme determina o artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal (princípio da presunção de inocência).

Quando há condenação definitiva, o que acontece?

Nesse caso, o impedimento pode ocorrer enquanto durarem os efeitos da condenação, que incluem:

  • A perda dos direitos políticos (quando fixada na sentença);

  • A suspensão dos direitos civis;

  • A impossibilidade de tomar posse em cargo público, conforme art. 15, III da Constituição Federal.

A depender do crime e do cargo almejado, o próprio edital pode prever a eliminação do candidato com base no requisito de conduta ilibada. Esse é um critério frequentemente usado para cargos da área de segurança pública, Judiciário e funções essenciais à Justiça, como Ministério Público e Defensoria.

2. Passagem pela polícia, boletim de ocorrência ou termo circunstanciado impedem posse?

Outro ponto que gera dúvidas é se o simples fato de ter um boletim de ocorrência (BO) ou um termo circunstanciado de ocorrência (TCO) pode impedir a posse.

A resposta é: não.

Esses registros indicam apenas que houve um fato que pode vir a ser investigado. Porém, sem condenação, não há impedimento legal à posse. A banca não pode eliminar o candidato apenas com base em registros de ocorrências policiais, salvo se estiver claramente previsto em lei e no edital — e mesmo assim, a Justiça já entendeu que essa eliminação precisa ser fundamentada de forma concreta, e não genérica.

3. TAC – Termo de Ajuste de Conduta impede concurso público?

O Termo de Ajuste de Conduta Criminal (muito comum em casos de contravenções penais, como perturbação do sossego) não gera condenação criminal e não deve impedir a posse em cargo público.

Trata-se de um acordo com o Ministério Público, que, ao ser cumprido, leva ao arquivamento do procedimento criminal. Ou seja, não há processo, não há sentença e não há antecedentes penais após o cumprimento do TAC.

4. E os crimes de trânsito? Posso ser impedido por uma infração na direção?

Infrações de trânsito comuns, como excesso de velocidade ou estacionamento irregular, não afetam a participação em concursos públicos.

Contudo, crimes de trânsito, como dirigir sob efeito de álcool (art. 306 do CTB) ou causar acidente com vítima, podem gerar ação penal e, em caso de condenação definitiva, levar à eliminação, especialmente em concursos da área de segurança pública.

5. Já fui condenado, cumpri a pena. Posso voltar a prestar concurso?

Sim. A Constituição Federal proíbe penas de caráter perpétuo, e a lei prevê mecanismos para reabilitação.

Você pode solicitar a chamada reabilitação criminal (art. 93 do Código Penal), que é uma forma de demonstrar à Justiça que você reconstruiu sua vida e merece uma nova chance. Ela permite que você volte a exercer direitos civis, inclusive ocupar cargos públicos, conforme o entendimento predominante no STJ.

Contudo, mesmo com a reabilitação, é possível que bancas insistam na eliminação, o que pode ser revertido por via judicial.

6. O que dizem os tribunais sobre antecedentes criminais e concursos públicos?

O STF já firmou o entendimento de que não é constitucional eliminar candidato por responder a inquérito ou ação penal, salvo se houver lei formal que preveja essa possibilidade para o cargo pretendido.

Além disso, o STF reafirmou que a simples cláusula editalícia não é suficiente para impedir a posse, caso não esteja respaldada por norma legal específica.

Exemplo:

Na ADI 5526, o STF declarou inconstitucional a eliminação de candidatos com base exclusiva na existência de processos ou inquéritos em andamento, sem condenação definitiva.

Já o STJ tem decisões variadas. Em algumas turmas, o tribunal já decidiu que:

  • A condenação definitiva pode ser usada como critério de eliminação, principalmente em concursos que exigem conduta ilibada (REsp 1.822.219/SP).

  • Condutas antigas e de menor gravidade não devem impedir a posse, com base nos princípios da proporcionalidade e vedação de pena perpétua.

Cada caso é analisado de forma individualizada.

7. Posso assumir o cargo mesmo respondendo a processo criminal?

Sim. Enquanto não houver sentença penal condenatória com trânsito em julgado, você pode ser nomeado e tomar posse.

Porém, caso a condenação ocorra durante o estágio probatório, ainda existe a possibilidade de demissão motivada por reprovação, sobretudo se o cargo exige reputação ilibada.

8. E se eu for eliminado indevidamente, o que posso fazer?

Nesses casos, é possível entrar com ação judicial pedindo a anulação da eliminação. As principais medidas são:

  • Mandado de Segurança, quando houver ilegalidade flagrante, como eliminação por boletim de ocorrência sem previsão no edital.

  • Ação ordinária, para discutir a interpretação do edital e os limites da fase de investigação social.

Recomenda-se sempre que a ação seja fundamentada em princípios como:

  • Presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF);

  • Acesso universal aos cargos públicos (art. 37, I, CF);

  • Vedação de penas de caráter perpétuo (art. 5º, XLVII, “b”).

9. Considerações finais: não desista do seu projeto de vida

Se você chegou até aqui com essa dúvida, saiba que não está sozinho. Muitos candidatos enfrentam o medo de serem barrados por fatos do passado, muitas vezes sem sequer haver condenação.

Mas é fundamental lembrar: nem sempre a banca está certa. E mesmo quando parece estar, há caminhos legais para reverter injustiças.

A depender do caso, é possível sim:

  • Prestar concursos;

  • Ser nomeado e tomar posse;

  • Recorrer administrativamente ou judicialmente contra eliminação indevida;

  • Limpar o seu histórico e buscar sua reabilitação na Justiça.

Se você foi prejudicado em algum concurso por uma investigação social ou por um processo antigo, procure orientação especializada. Um advogado com experiência em concursos públicos pode analisar seu caso de forma detalhada e ajudar a garantir seus direitos.