Regime de execução: o que todo empresário precisa saber antes de entrar em uma licitação

Sarah Carneiro*

Empresários que atuam no setor de obras e serviços de engenharia sabem que uma licitação vencida pode mudar o patamar da empresa — desde que o contrato firmado seja bem estruturado. Por outro lado, cláusulas mal interpretadas ou ignoradas, especialmente as que afetam o fluxo de caixa, podem transformar uma oportunidade em um sério risco financeiro.

Diante de tantos editais publicados diariamente, como diferenciar boas oportunidades de verdadeiras armadilhas contratuais? Como saber se aquela licitação realmente faz sentido para o momento da empresa?

A resposta não está na sorte, e sim na leitura atenta de elementos técnicos do edital — entre eles, um que merece atenção especial: o regime de execução.

Afinal, o que é o regime de execução?

Embora a Lei nº 14.133/2021 não traga um conceito direto, ela enumera os regimes de execução possíveis em contratos com a Administração Pública:

  • Empreitada por preço unitário
  • Empreitada por preço global
  • Empreitada integral
  • Contratação por tarefa
  • Contratação integrada
  • Contratação semi-integrada
  • Fornecimento e prestação de serviço associado

Na prática, o regime de execução define como a obra ou serviço será contratada, medida e paga. Ou seja, orienta desde o planejamento da licitação e a elaboração dos documentos preparatórios, até a forma como a execução será fiscalizada e os pagamentos liberados.

Apesar da diversidade prevista em lei, dois modelos são predominantes: a empreitada por preço global e a empreitada por preço unitário.

Diferença prática entre preço global e preço unitário

Na empreitada por preço unitário, a Administração contrata o serviço com base em preços por unidade (m², m³, hora, quilômetro, etc.). Ela sabe o que será feito, mas não tem precisão sobre a quantidade. Os pagamentos são realizados conforme as medições das quantidades efetivamente executadas.

Já na empreitada por preço global, a Administração contrata a execução do objeto por um valor fechado. Nesse caso, tanto o que será feito quanto os quantitativos estão definidos de forma precisa desde o início.

Na teoria, a distinção é simples. Na prática, porém, a escolha do regime influencia diretamente:

  • A elaboração da proposta técnica e financeira;
  • A frequência das medições e dos pagamentos;
  • A possibilidade (ou não) de alterações contratuais;
  • O ritmo da execução.

Por isso, entender o regime de execução antes de elaborar a proposta é essencial para proteger o caixa da empresa e evitar problemas durante a execução do contrato.

O que analisar no edital, de forma prática

Alguns cuidados prévios ajudam a entender melhor o impacto do regime de execução:

  1. Regime: empreitada por preço global
  • Verifique com atenção as planilhas de serviços, avaliando se os quantitativos estimados realmente são suficientes para a entrega completa do objeto.
  • Busque no edital a existência do eventograma — documento que apresenta o ritmo previsto da obra e permite projetar as medições e os fluxos de pagamento.
  1. Regime: empreitada por preço unitário
  • Confirme se o edital apresenta um cronograma de execução com a periodicidade de medições e pagamentos. Isso ajuda a estimar o fluxo de recebíveis e a organizar o planejamento financeiro.

A importância do regime também durante a execução

O regime de execução tem efeitos que vão além da licitação: ele também influencia a execução do contrato. Um exemplo claro vem da jurisprudência do Tribunal de Contas da União (TCU), que já consolidou entendimento de que não cabe aditivo contratual para variações pequenas de quantitativo em contratos por preço global.

Essa orientação está expressa, por exemplo, no Acórdão nº 1977/2013 – Plenário/TCU, e é um alerta para quem acredita que poderá compensar falhas na fase de orçamento por meio de aditivos no decorrer da obra. Nem sempre será possível.

Conclusão

Analisar o regime de execução adotado em uma licitação é um passo técnico, mas indispensável para o sucesso contratual.

Empresas que dominam esse tipo de análise saem na frente: sabem o que esperar da execução, evitam surpresas e conseguem alinhar melhor sua estrutura operacional ao cronograma da Administração.

Antes de entrar em uma disputa, vale a pena olhar além do valor estimado e identificar se o regime proposto faz sentido para o seu negócio.

*Sarah Carolina Viana de Macêdo Carneiro. Mestre em Direito. Especialista em Direito Público. Especialista em Licitações e Contratos Administrativos. Advogada Pública. Coautora do Livro “Nova Lei de Licitações e Contratos: teoria e prática na assessoria jurídica”, Editora Del Rey, 2023. Autora de livros e artigos e palestrante na área de Licitações e Contratos. Cofundadora do projeto Vantagem Lícita. Coordenadora do Núcleo de Licitações e Contratos do escritório Merola & Ribas Advogados.