Crédito rural e a nova regulamentação do Conselho Monetário Nacional: impactos e implicações

Na coluna desta quarta-feira (9), estagiário do GMPR Advogados,  Salomão Gondim, escreve sobre a nova regulamentação do Conselho Monetário Nacional sobre o crédito rural.

Salomão Gondim

Leia a íntegra do texto:

O crédito rural constitui instrumento essencial ao financiamento da produção agropecuária no Brasil, permitindo a aquisição de insumos, a modernização da infraestrutura produtiva e a comercialização da safra. Regulamentado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), esse crédito busca assegurar que os recursos destinados ao setor agrícola sejam aplicados de forma estratégica, promovendo o desenvolvimento econômico sem comprometer a estabilidade financeira e socioambiental do país.

O CMN, como órgão normativo máximo do Sistema Financeiro Nacional, exerce papel central na regulação do crédito rural. Define diretrizes, limites e critérios para sua concessão. Ao fixar normas sobre taxas de juros, prazos e garantias, assegura que os financiamentos atendam tanto às demandas do setor agropecuário quanto às exigências macroeconômicas. Além disso, ao incluir condicionantes socioambientais, alinha o crédito rural às diretrizes de desenvolvimento sustentável, evitando impactos decorrentes do desmatamento e da ocupação irregular do solo.

Nesse contexto, a Resolução nº 5.193, de 19 de dezembro de 2024, promoveu alterações relevantes no Manual de Crédito Rural (MCR). Ampliou restrições a empreendimentos situados em áreas com passivos ambientais e estabeleceu novos critérios para a concessão de crédito. Destaca-se, dentre as mudanças, a vedação de crédito para imóveis localizados em florestas públicas não destinadas, salvo se titulados ou com área inferior a quinze módulos fiscais.

Mantém-se, ainda, a proibição de financiamento a propriedades embargadas por desmatamento ilegal. Contudo, admite-se a concessão de crédito exclusivamente voltado à recuperação ambiental, desde que o produtor comprove a regularização da área e apresente projeto técnico aprovado.

Especificamente para essas situações, admite-se, até 30 de junho de 2027, acesso ao crédito rural mediante comprovação de que o produtor está em processo de regularização ambiental. Entretanto, essa exceção aplica-se somente a áreas embargadas que não ultrapassem 5% do imóvel. Além disso, o produtor deverá atender a requisitos cumulativos, como isolamento da área, inexistência de atividades agropecuárias no local e pagamento de multas aplicáveis.

A partir de 2 de janeiro de 2026, as instituições financeiras deverão verificar a ocorrência de supressão de vegetação nativa após 31 de julho de 2019. Essa verificação será realizada com base nos dados do sistema PRODES, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Caso se constate desmatamento no período, a concessão do crédito ficará condicionada à apresentação de documentação comprobatória, como autorização válida de supressão ou adesão a programas de regularização.

Também se reforçou a proibição do uso do crédito rural para atividades que impliquem nova supressão de vegetação nativa, mesmo que autorizadas. Essa medida visa impedir o financiamento de práticas incompatíveis com os compromissos ambientais do país.

As alterações introduzidas produzem efeitos distintos, conforme o porte do produtor. Aqueles em conformidade ambiental mantêm o acesso ao crédito e, em certos casos, ampliam sua elegibilidade. Pequenos produtores foram beneficiados por flexibilizações específicas, como o aumento do limite de módulos fiscais para crédito em áreas de floresta pública.

Por outro lado, produtores com passivos ambientais deverão comprovar regularização efetiva. Isso pode representar obstáculo considerável, especialmente diante da necessidade de assistência técnica especializada e da complexidade documental exigida.

As instituições financeiras também assumem novas obrigações. Devem verificar a regularidade socioambiental dos empreendimentos, com base em dados públicos e tecnologias de georreferenciamento. Para isso, será necessário investir em sistemas de monitoramento e capacitação técnica. Ademais, a constatação de infração ambiental durante a vigência do contrato poderá ensejar a desclassificação da operação, com possíveis consequências financeiras.

Embora a norma tenha suscitado críticas, sobretudo quanto à sua aplicação em regiões de fronteira agrícola e à suposta elevação da burocracia, sua relevância é inegável. A resolução consolida um modelo de financiamento agropecuário comprometido com a legalidade fundiária e a sustentabilidade ambiental. Nesse sentido, reconhece-se a importância do produtor rural, agente essencial da cadeia econômica nacional, cuja atuação responsável é fundamental para a preservação do meio ambiente e para o fortalecimento da economia.

O prognóstico, portanto, é positivo. A Resolução CMN nº 5.193/2024 tende a fortalecer, a médio e longo prazo, uma agricultura mais eficiente, segura e ambientalmente responsável. Além disso, fomenta a integração definitiva entre acesso ao crédito e conformidade legal. Nesse cenário, a regularização fundiária e ambiental não apenas se torna requisito para a liberação de financiamentos, mas consolida-se como pilar da política agrícola nacional, imprescindível ao desenvolvimento sustentável do setor.