Comentários acerca da Medida Provisória nº 948, de 08 de abril de 2020, que afetou os setores do turismo e entretenimento

*Felipe Guimarães Abrão

Já está valendo a nova Medida Provisória, a MP n.º 948, de 08 de abril de 2020, que dispõe sobre o cancelamento de serviços, de reservas e de eventos dos setores de turismo e cultura em razão da pandemia do novo coronavírus (Covid-19). Oportuno relembrar que o estado de calamidade pública em decorrência do Covid-19 foi reconhecido no Brasil por meio do Decreto Legislativo de n.º 6, de 2020.

Em linhas gerais, essa nova MP veio para trazer solidez a alguns contratos de consumo que, em decorrência do Covid-19, podem ou poderiam ser impactados, de forma a minimizar alguns dos efeitos negativos que a pandemia trouxe ao mercado brasileiro, sobretudo nos setores do turismo e do entretenimento.

Em começo de análise, a nova MP enumera quais setores serão abrangidos por suas disposições, sendo eles:

  1. Prestadores de serviços turísticos e sociedades empresárias cuja cadeia produtiva de turismo englobe os seguintes setores: agências de turismo, meios de hospedagem, transportadoras turísticas, organizadoras de eventos, parques temáticos e acampamentos turísticos; e
  2. Cinemas, teatros e plataformas digitais de vendas de ingressos pela Internet.

Conforme a nova MP, os fornecedores não serão obrigados a reembolsar os valores pagos pelos consumidores nos casos de cancelamento de serviços, de reservas e de eventos, incluídos shows e espetáculos, desde que assegurem: a remarcação dos mesmos; a disponibilização de crédito para uso ou abatimento na compra de outros serviços, reservas e eventos, disponíveis nas respectivas empresas; ou formalize algum outro acordo com o cliente. Resta estabelecido, ainda, que não poderá ser cobrado absolutamente nada dos consumidores por quaisquer destas operações, desde que as solicitem em 90 dias da data de entrada em vigor da MP, que ocorreu em 09 de abril de 2020.

Com relação à disponibilização de crédito citada no parágrafo anterior, a nova MP estabelece que o consumidor poderá utilizá-lo em até 12 (doze) meses após o término do estado de calamidade pública reconhecido pelo citato Decreto Legislativo n.º 6/20.

No tocante à possibilidade de remarcação dos serviços, a Medida Provisória dispõe que os fornecedores desses serviços deverão respeitar a sazonalidade e os valores dos serviços originalmente contratados e, além disso, o prazo de 12 (doze) meses, contado da data do encerramento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo n.º 6/20.

Outro ponto relevante trazido pela nova MP foi a hipótese de restituição, por parte dos fornecedores de tais serviços, do valor recebido pelos consumidores quando não se for possível alcançar nenhuma das citadas e possíveis hipóteses de não reembolso. Nestes casos, a restituição deve ser feita em até 12 (doze) meses, contado do encerramento do estado de calamidade pública, utilizando-se como índice de atualização monetária o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E).

Em seu parágrafo quarto, a Medida Provisória estatui que “os artistas já contratados, até a data de edição desta Medida Provisória, que forem impactados por cancelamentos de eventos, incluídos shows, rodeios, espetáculos musicais e de artes cênicas e os profissionais contratados para a realização destes eventos não terão obrigação de reembolsar imediatamente os valores dos serviços ou cachês, desde que o evento seja remarcado, no prazo de doze meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 2020”.

Complementa no parágrafo único que “na hipótese de os artistas e os demais profissionais contratados para a realização dos eventos de que trata o caput não prestarem os serviços contratados no prazo previsto, o valor recebido será restituído, atualizado monetariamente pelo IPCA-E, no prazo de doze meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 2020”.

Por final, o artigo 5º (quinto) da nova MP menciona a seguinte questão: “as relações de consumo regidas por esta Medida Provisória caracterizam hipóteses de caso fortuito ou força maior e não ensejam danos morais, aplicação de multa ou outras penalidades, nos termos do disposto no art. 56 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990”.

Para finalizar, quanto ao parágrafo quinto mencionado acima, gostaria de registrar uma crítica pessoal: não é a relação de consumo em si que configura caso fortuito ou força maior, mas, sim, o evento coronavírus, que é o fato superveniente inevitável e imprevisível, e seus efeitos negativos. Além disso, o presente autor também não concorda com o afastamento expresso dos danos morais, pois isso é uma questão jurisdicional, que, por sua vez, não pode ser regulada via Medida Provisória.

*Felipe Guimarães Abrão é advogado e consultor jurídico especialista em Direito do Consumidor e em Direito Imobiliário e é membro da equipe Rogério Leal & Advogados Associados.

*Acesso à Medida Provisória n.º 948/20: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2020/Mpv/mpv948.htm

*Acesso ao Decreto Legislativo n.º 6/20: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/portaria/DLG6-2020.htm