TRT-GO nega cancelamento de cartões de crédito como medida coercitiva para pagamento de dívidas

O cancelamento de cartões de crédito, bem como a suspensão e apreensão da CNH e passaporte, configura-se prática de atos imoderados e abusivos, infringindo substancialmente os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Esse foi o entendimento da Segunda Turma do TRT18 ao analisar um Agravo de Petição, recurso utilizado na fase de execução. O recurso questionava decisão do juízo da 5ª VT de Goiânia que havia negado pedido de utilização dessas medidas coercitivas para a satisfação das dívidas trabalhistas. O processo foi ajuizado no Tribunal em 2007.

O trabalhador argumentou que o pedido para suspensão da CNH e passaportes e cancelamento dos cartões de crédito se insere nas hipóteses em que é cabível a aplicação do art. 139, inciso IV,do Código de Processo Civil, que diz que incumbe ao juiz determinar todas as medidas coercitivas para assegurar o cumprimento de ordem judicial. Ele ressaltou que o processo já tramita há 10 anos sem que qualquer valor razoável tenha sido pago e que, além disso, o executado (Nacional Empreendimentos e Serviços Administrativos Ltda-ME, de Sergipe) não paga a dívida, não indica bens à penhora nem faz proposta de acordo.

Desembargadora Kathia Albuquerque

A desembargadora Kathia Albuquerque, que analisou o Agravo de Petição, ressaltou que a Instrução Normativa nº 39/2016 do TST, embora tenha reconhecido a aplicabilidade do art. 139, IV, do CPC/2015 ao processo do trabalho, ressaltou que o Código de Processo Civil é aplicado subsidiária e supletivamente ao Processo do Trabalho, em caso de omissão, e desde que haja compatibilidade com as normas e princípios do Direito Processual do Trabalho.

Para a magistrada, faz-se necessária uma interpretação lógico sistemática do art. 139, inciso IV, do CPC conforme os princípios do Direito Processual do Trabalho e da própria Constituição Federal, “no sentido de que a expressão ‘todas as medidas’ não pode ser utilizada de esteio para chancelar medidas que violem direitos fundamentais (art. 5º c/c 60, §4º da CF) ou que sejam desarrazoadas e contraproducentes”, afirmou. Além disso, ela destacou que a execução, apesar de ser realizada no interesse do credor, deve seguir o caminho menos gravoso (art. 797 e 805 do CPC). “É imperioso que o julgador observe as peculiaridades do caso concreto, bem como as premissas hermenêuticas traçadas”, disse.

Kathia Albuquerque considerou ainda que o Direito precisa se basear em casos concretos. Ela mencionou que os executados necessitam de suas CNHs para se locomoverem até o seu local de trabalho, de onde advêm o seu sustento, e que os cartões de crédito são ferramentas de pagamento necessárias até mesmo ao pagamento de necessidades vitais básicas dos executados e de suas famílias. Além disso, ela entendeu que não constam nos autos nenhuma evidência de que os executados têm a intenção de abandonar o país, e suspender os seus passaportes violaria o direito fundamental à livre locomoção.

Assim, ao entendimento de que utilizar de meios de coerção, condicionando o direito de liberdade e da dignidade dos executados ao pagamento de suas dívidas implicaria retrocesso civilizatório, os membros da Segunda Turma, por unanimidade, negaram provimento ao recurso do trabalhador.

PROCESSO TRT – AP – 0086200-28.2007.5.18.0005