Mesmo com inadimplência de clientes, crise gera oportunidades para escritórios de advocacia

Wanessa Rodrigues

A atual conjuntura política e econômica do país mostra um cenário difícil para a sobrevivência de empresas. Mas, para escritórios de advocacia, a retração da economia brasileira tem gerado desafios e oportunidades. Especialistas ouvidos pelo Portal Rota Jurídica afirmam que a procura por serviços de advogados aumentou justamente em função da situação enfrentadas pelas empresas. Porém, por outro lado, a inadimplência de clientes também teve acréscimo.

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Advogado Rafael Lara Martins, do escritório Lara Martins Advogados.

O advogado Rafael Lara Martins, do escritório Lara Martins Advogados, observa que há uma maior procura pelo escritório, uma vez que as empresas passam a não conseguir resolver suas questões por si só. O profissional ressalta que, tanto o trabalho de Suporte Legal para a empresa (não um simples “consultivo”, mas uma verdadeira cogestão dos negócios), quanto a gestão de litigioso, precisam ser repensados em momentos de crise.

Mas, apesar do fato de a advocacia ter registrado aumento de trabalho em algumas áreas, a crise atingiu os clientes. Diante disso, houve registro de inadimplência e necessidade de renegociação de contratos. Segundo Martins, nos primeiros três meses do ano, em seu escritório, foi contabilizado índice de inadimplência nos contratos mensais próximo a 50%. Assim, conforme diz, foi necessário traçar um perfil do cenário para compreender o contexto de cada cliente e gerar possibilidade de sanar a dívida e continuar a prestação de serviços.

A situação também foi registrada no escritório Rodovalho Advogados. Cynthia Almeida de Oliveira, sócia gestora do escritório, conta que a inadimplência aumentou consideravelmente. Com relação à renegociação de contratos, ela diz que o procedimento tem sido o de incluir mais serviços para justificar a não redução em termos de valores, ou seja, oferecer outras áreas ou outros serviços como um pacote. Porém, ela observa que, como os honorários mensais têm uma lucratividade menor, não é possível muita redução. Por isso, o escritório preferiu abrir mão de clientes nesse caso.

Por outro lado, a advogada observa que o empresário está mais temerário e, diante disso, busca ter mais segurança ao fazer determinados negócios. Segundo a especialista, a procura é por uma análise jurídica 360º graus, ou seja, aquela que engloba várias áreas do Direito dentro do negócio. “O empresário entende que cortar custos não implica em arriscar-se mais”, diz.

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Advogado Jacó Coelho, do escritório Jocó Coelho Advogados Associados .

Acordos
Jacó Coelho, do escritório Jacó Coelho Advogados Associados, ressalta que um cenário de crise leva as pessoas a buscarem com mais urgência o recebimento de dívidas e de direitos que entendem ter. Neste sentido, houve um crescimento na procura pelos serviços em seu escritório, incluindo ajuizamento de novas ações. Segundo ele, é frequente também a busca de resoluções rápidas de conflitos tendo como alternativa, por exemplo, o encerramento de ações com a realização de acordos.

Coelho diz que a crise tem atingido vários segmentos da economia e, com isso, a renegociação dos contratos é quase que inevitável. “Mas o trabalho permanece e, com ele, é necessário também manter a qualidade na prestação dos serviços”, declara. O especialista diz que não se pode perder de vista a análise fria dos números quanto à viabilidade de cada contrato, precificando o serviço de forma adequada de acordo com cada cliente, sob pena de sérios prejuízos. Na advocacia, segundo ele, não é diferente. Assim, é preciso que o advogado ou o escritório tenha em mente que a fixação de honorários não depende apenas da importância ou do grau de dificuldade do processo. “É preciso avaliar o custo para atingir a prestação do serviço exigido pelo cliente, o grau de complexidade, o tempo demandado, a equipe necessária e, por óbvio, a receita deve ser suficiente para abarcar os custos e manter uma margem mínima de lucro”, completa.

Alternativas
A alternativa encontrada pelo escritório Rodovalho Advogados para minimizar os efeitos da crise, principalmente no que diz respeito aos clientes, segundo aponta Chyntia, foi oferecer serviços de mais áreas. “Como, por exemplo, o cliente que só atendíamos no tributário passamos oferecer alguns serviços do trabalhista e vice versa, ou oferecer serviço de suporte ao departamento jurídico, como análise de contratos internos, planilhamento, orçamento jurídico, enfim, ou trabalhar tal qual um jurídico interno ou prestar-lhe suporte em suas ações”, explica.

Martins diz que um escritório de advocacia tem que ser parceiro de seu cliente e, acima de tudo, honesto. O advogado ressalta que, em primeiro lugar, é necessário identificar o perfil e a efetiva necessidade do cliente. Por vezes, um contrato mensal fixo é a melhor opção, mas essa não é a única forma de trabalhar. Segundo ele, é possível reduzir o valor do contrato mensal e inserir (ou majorar) uma participação percentual no sucesso das demandas. Em outros casos, uma assessoria jurídica mensal – especialmente para pequenas empresas – é desnecessária, sendo mais razoável fazer a contratação por demanda e pagar eventual trabalho consultivo por hora.

Oportunidade
Em momentos de crise, segundo apontam os especialistas, também surge oportunidade de crescimento para os escritórios de advocacia. Martins observa, por exemplo, que um escritório especialista em consultoria e gestão de litigioso trabalhista e empresarial tende a se fazer presente em qualquer momento econômico. Ele explica que, em tempos de economia saudável, empresários precisam planejar o RH para reter os profissionais – assediados pelo mercado -, o que leva a uma alta rotatividade e, consequentemente, um grande número de demandas.

Já em tempos de crise, as demissões e o desemprego aumentam, gerando demandas judiciais de profissionais que normalmente não procuram a Justiça do Trabalho – aqueles com altos salários, o que gera, consequentemente, demandas de maior valor. “Os escritórios precisam estar preparados para dar esta resposta do litigioso complexo e, muitos mais do que isso, ser parceiro da empresa no momento difícil”, orienta.

Para Cynthia, sempre há oportunidades de crescimento, com crise ou sem ela. A advogada diz que demanda nunca vai deixar de haver e clientes também não. Mas, em um momento delicado para a economia como a atual, as áreas de planejamento tributário, planejamento societário ou sucessório, e claro, recuperação judicial ou negociação de dívidas tem a demanda mais aquecida, segundo afirma a advogada.

Administração
Coelho observa que a administração de um escritório em momentos de dificuldade financeira exige ainda mais precisão nos ajustes. É preciso avaliar se as formas de gestão financeira, de processos internos e de pessoas estão adequados e, sobretudo, analisar os custos. É também um momento de voltar os olhos para o mercado, identificar as possíveis áreas que se abrem para novos negócios, a exemplo de novos clientes com alto índice de inadimplência com seus fornecedores ou mesmo de seus clientes.

Quase sempre o aperto provocado pela crise, segundo o advogado, gera uma situação favorável à negociação. Hora de buscar meios alternativos de solução de conflitos como a conciliação, a mediação e a arbitragem. “Não há espaço para amadorismo, as empresas precisam entender que o velho tradicionalismo profissional limita o crescimento do escritório, por isso o profissional precisa ser pró-ativo, ter coragem e ousadia para enfrentar este mercado acirrado”, diz Coelho.