Juiz libera menor infrator e multa Estado por não disponibilizar vaga para internação

O juiz da comarca de Crixás, Alex Alves Lessa, aplicou multa de R$ 5 mil em razão do descumprimento de ordem judicial que determinou a internação de um menor. Foram multadas as diretorias do Grupo Executivo de Apoio a Crianças e Adolescentes (Gecria) e da Secretaria Estadual Cidadão. O magistrado determinou que as dirigentes dos respectivos órgãos sejam notificadas pessoalmente para tomarem conhecimento da decisão.

Além disso, o magistrado oficializou o Ministério Público para apuração de possíveis práticas de crimes de desobediência, ato de improbidade administrativa por parte da Secretária Estadual da Secretaria Cidadão e da diretora do Gecria e ainda a apuração de possível abandono de incapaz. Diante disso, em razão da não disponibilidade de vaga em Unidade de Internação Provisória, com base nos artigos 185, parágrafo 2º, do ECA, o juiz revogou a internação provisória decretada em desfavor do menor J.B.L.J.

E, por consequência da desinternação, a título de tutela cautelar protetiva, Alex Lessa determinou que o menor J. L. B. J seja encaminhado aos avós paternos, únicos responsáveis conhecidos e identificados, os quais terão a guarda do adolescente, mediante termo de responsabilidade; que se oficie o Centro de Referência Especializada de Assistência Social (Creas) para iniciarem, de imediato, orientação, apoio e acompanhamento temporários ao menor infrator e seus familiares, sob pena de responsabilidade por descumprir ordem judicial; oficie-se o Secretário Municipal de Educação para, em cinco dias, informar sobre a possibilidade de matrícula imediata do menor em estabelecimento oficial de ensino no Município, bem como providenciar matrícula para o próximo ano letivo, sob pena de responsabilidade por descumprir ordem judicial e por fim, que o CAPS promova a inclusão imediata do menor em programa oficial de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos, sob pena de responsabilidade por descumprir ordem judicial.

No caso em questão, para o juiz, não restam dúvidas de que a internação provisória do menor J.B.L.J. é necessária e proporcional aos fatos imputados, tendo em vista a prática reiterada de atos infracionais correspondentes a furto, roubo, ameaça, porte de arma, sendo suspeito na participação de homicídios, bem como ameaça exercida com arma de fogo a outro adolescente, inclusive ameaça proferida contra sua avó na presença do juiz, do promotor e do defensor, em audiência de apresentação realizada nesta comarca.

Segundo Alex Lessa, o princípio do dever de proteção, neste caso, ganha dupla função: proteção das vítimas e do próprio adolescente infrator. “Destaco, ainda, que o menor J. L. B. J. foi abandonado pelos pais e os avós paternos, além de idosos, têm precárias condições físicas e financeiras para solucionar o problema, fato este constatado em audiência não só pela ameaça, mas principalmente pelo fato de que há bastante tempo o menor não reside na casa dos avós, além de, provavelmente, ter sido cooptado por criminosos locais, para prática de crimes, criminosos estes com os quais o menor deve estar residindo. Veja-se, portanto, que a internação aqui decretada é fundamental para a proteção do próprio menor infrator, principalmente, diante de inúmeros homicídios tendo como vítimas adolescentes envolvidos com o crime, todos ocorridos neste ano (praticamente quase 1 homicídio por mês), fato este que não pode ser ignorado pelo juiz da Infância e da Juventude”, frisou.

O juiz fez questão de ressaltar que nas informações constantes em um ofício do Gecria, restou comprovada a omissão estatal consistente no descumprimento de deveres impostos e prioritários. “Admitir os argumentos fáticos do Gecria seria o mesmo que ressuscitar a teoria dos fatores reais de Poder de Lassalle, no sentido de que a Constituição Federal seria uma mera folha de papel, sem qualquer valor normativo”, pontuou.

Para Alves Lessa, fica claro e comprovado pelo ofício a omissão inconstitucional do Estado de Goiás, da Secretária Cidadão e da diretoria Geral do Gecria, na implementação de políticas públicas para dar cumprimento à determinação Constitucional e legal quanto aos direitos de crianças e adolescentes infratores.

“Por fim, cabe sempre destacar, diante deste cenário de sistemático descumprimento de determinações do Poder Judiciário, que o pressuposto básico do Estado de Direito é de que as decisões judiciais sejam devidamente cumpridas, podendo os juízes, para tanto, adotar medidas de coerção para garantir a efetividade. O sistema democrático exige, pois, que as decisões judiciais sejam respeitadas”, finalizou o magistrado.

ECA
Na decisão, o juiz fez questão de ressaltar que embora inimputáveis, adolescentes estão sujeitos às medidas socioeducativas do artigo 112 do ECA, como advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade, internação e algumas medidas protetivas. Ele afirmou que deve o Estado tutelar os direitos fundamentais de crianças e adolescentes infratores, mas também deve proteger direitos fundamentais de vítimas sujeitas a atos de violência e grave ameaça.

Portanto, quanto maior a gravidade do ato infracional, mais restritiva a medida socioeducativa. Segundo Alex Lessa, a medida de internação é cabível nos moldes do artigo 122, incisos I, II e III, do ECA, em casos de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa; reiteração no cometimento de outras infrações graves; descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta.

“No caso específico, embora não se discuta direito penal em si, mas aplicação de medidas socioeducativas em razão de prática de atos infracionais graves, como os fatos envolvem conflito de direitos fundamentais, o raciocínio é o mesmo, com a distinção de que crianças e adolescentes possuem mais direitos fundamentais do que os adultos, o que exige do Estado maior atenção e prioridade na adoção de medidas protetivas e socioeducativas, que, como dito, têm como base os princípios do melhor interesse e da proteção integral”, pontuou ao citar o artigo 227 da Constituição Federal e o ECA. Fonte: TJGO

Processo 201603110989