Medo do novo

*Diego Amaral

Recentemente, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás publicou reportagem, que foi repercutida no Rota Jurídica, apontando a existência de inúmeras ações no Judiciário questionando as cotas imobiliárias. O foco é informar ao consumidor adquirente do produto, também conhecido como Fractional ou propriedade fracionada, sobre os bastidores da venda de cotas imobiliárias realizadas na cidade de Caldas Novas-GO.

No texto, o TJGO sugere erroneamente, no meu ponto de vista,  que a venda desse tipo de produto é realizada de maneira persuasiva e impactante, sem que o consumidor tenha tempo suficiente para fazer a leitura do instrumento contratual ou mesmo para amadurecer sobre a realização ou não da pretensa aquisição.

Pondera, ainda, a preocupação com o número de ações ajuizadas que discutem tal contrato, disponibilizando os seguintes dados: que no Juizado Especial Cível e Criminal da cidade de Caldas Novas, de junho até agora, foram ajuizadas 65 ações envolvendo o tema cotas imobiliárias; que, naquele município, há em média 50 mil cotas imobiliárias sendo comercializadas; e que a média de cancelamento desse tipo de aquisição de produto é de 30%.

O TJ-GO não andou bem ao publicar tal reportagem sem antes se aprofundar no tema. Isso porque, se de um lado o modelo de propriedade compartilhada, com atuação intensa no Brasil há cerca de 5 anos, tem como objetivo do negócio, por óbvio, o lucro do empreendedor, por outro, permite o acesso de milhares de pessoas a propriedades de férias, as quais jamais conseguiriam por meio do modelo de incorporação plena ou tradicional.

Caldas Novas juntamente com Gramado-RS são conhecidas como as capitais nacionais do produto “Propriedade Compartilhada”, exatamente por serem cidades que atraem turistas de todos os cantos desse país continental chamado Brasil.

Esse novo modelo de negócio turístico imobiliário possibilitou que as pessoas adquirissem uma segunda propriedade, pagando por elas valores que cabem em seu bolso, sem comprometerem sua vida financeira, com a possibilidade de dividirem essa mesma propriedade com outras pessoas que as utilizam 3 ou 4 vezes ano, assim como qualquer “casa de férias”.

De fato, aquela pessoa que antes mantinha sozinha o custo de aquisição e manutenção de um imóvel que utilizava de 2 à 5 vezes ao ano, agora pode dividir o custo do bem com outras pessoas mantendo o mesmo número de vezes de utilização do imóvel, o que é excelente do ponto de vista do consumidor.

Esse formato de negócio imobiliário é tendência no mundo todo e não só no Brasil e se há 65 ações ajuizadas no judiciário de Caldas Novas-GO, de junho até o fim do mês de setembro do corrente ano, envolvendo esse tema, estamos falando de um número ínfimo de ações perante o tamanho do giro do negócio – 50 mil cotas em comercialização somente na cidade de Caldas Novas. Os 30% de cancelamento dos negócios, citados na matéria, ainda são menores do que a média de distrato das incorporações plenas e convencionais, que, segundo dados da ADEMI-GO, giraram em torno de 40% no último ano. Assim, os 30% de cancelamento ainda são menores do que os 40% de distratos que impactaram consideravelmente a economia nacional nos anos de 2015, 2016 e, ainda, no início do ano de 2017.

Nós, brasileiros, temos o costume de criticar o novo, os novos modelos, as novas tendências e tudo aquilo que é realizado de forma inovadora ou diferente, criticando e até prejudicando a evolução de fatores e elementos que vêm para contribuir com a sociedade, economia e função social dos negócios praticados. Isso é errado e deve ser veementemente combatido.

As cotas imobiliárias com a ideia de “dividir para multiplicar” surgiram para contribuir com todas as partes envolvidas do negócio e cabe ao Poder Judiciário estar preparado para as demandas que lhe serão apresentadas, julgando-as com propriedade, competência e justiça, de modo contribuir para a evolução do negócio e não emitir juízo de valor antes mesmo de enfrentar o tema, simplesmente por considerar que o número de ações ajuizadas sobre determinado assunto é alto.

O Estado de Goiás, inclusive o seu judiciário e os operadores do direito que nele atuam, devem ter orgulho de possuir uma cidade conhecida como a capital nacional de determinado assunto e não se apresentarem preocupados simplesmente por estarem lidando com o novo. O novo deve ser entendido, discutido e até melhorado, se for o caso, mas jamais criticado sem o conhecimento pleno para tal.

*Diego Amaral é advogado, Conselheiro Seccional da OAB/GO, Presidente da Comissão de Direito imobiliário da OAB/GO, Palestrante, Professor Universitário e de Pós-Graduação.