A estigmatização do condenado: caso goleiro Bruno

“Lembrai-vos dos encarcerados, como se vós mesmo estivésseis presos com eles. E dos maltratados, como se habitásseis no mesmo corpo com eles” (Hebreus 13,3)

É indubitável que na sociedade contemporânea o estigma do “criminoso” constitui decorrência lógica da condenação criminal. Não parece sujeito a questionamentos, que a visão prevalecente destinada ao condenado é provida de feições de preconceito, justificando, inclusive, a dificuldade fática de se imputar ao condenado o escopo da ressocialização.

Sem óbice da diversidade de elementos negativos com que se depara o condenado por conta da prisão, parece ser fator comum a todos a ausência de aceitação e inserção.

Em um ambiente social como nosso, em que a resposta à criminalidade beira o ódio, “bandido bom é bandido morto”, não se pode esperar outra atitude. Hipócrita ou irreal é a crença segunda a qual, “todo mundo tem direito ao erro, logo possui uma segunda chance”.

Conforme Rogério Greco (2011, p. 443): “Parece-nos que a sociedade não concorda, infelizmente, pelo menos à primeira vista, com a ressocialização do condenado. O estigma da condenação, carregado pelo egresso, o impede de retornar ao normal convívio em sociedade.

O maior obstáculo enfrentado por esses indivíduos é ingressar novamente no mercado de trabalho, pois além da rotulação – Teoria do Etiquetamento – de ex-presidiário, a maioria deles não possuem ensino fundamental completo e nem experiência profissional, sendo praticamente impossível serem admitidos em algum emprego.

Esse conjunto de fatores dificulta a necessária e humanitária reinserção do condenado ao convívio social auxiliando de forma direta o aumento da reincidência no país que já sofre com os altos índices de criminalidade e com a falência do sistema penitenciário.

 

Não muito distante, recentemente, acompanhamos a notícia que um clube de futebol teve rompidos os contratos com todos os seus patrocinadores, tão logo confirmada a contratação do goleiro Bruno (Caso Eliza Samudio). Senão antes, ter que deixar sua cidade sede, pois, a prefeitura daquela localidade também lhe negou apoio e bloqueou os incentivos.

Se, por um lado, o sistema contemporâneo penal acredita na política da ressocialização, por outro lado, temos uma sociedade remando na contramão, filiando-se ao Direito Penal extremado.

Faz necessário, primeiramente, que se compreenda que o responsável pela execução de um delito, uma vez condenado, tem direito a ressocialização e a inserção na sociedade. Não pode em um Estado Democrático de Direito, sob tal enfoque, prosperar Direito Penal similar àquele do Inimigo, defendido por Günther Jakobs.

A punição tem de ser dada em decorrência de um fato, e não da desvalorização de que foi por ele responsabilizado. Firmada essa compressão, deve-se ter em mente que os condenados, mesmo que tenham cometido algum ilícito grave, não deixam em momento algum de serem seres humanos. Afinal, se julgam os erros, não as pessoas.

Sendo assim, não basta apenas punir, faz necessário dar ao condenado condições de tonar-se melhor e pronto para voltar a viver ordeiramente em comunidade, inclusive para amenizar o cometimento de novos delitos, com a consequente diminuição da reincidência criminal.

Vale lembrar que a ressocialização além de ser um dos objetivos almejados pela pena, também é vista como uma possibilidade dada ao condenado para que este tenha condições de se reerguer, e ao voltar ao convívio comum possa ser produtivo e útil afastando de uma vez do submundo do crime.

Portanto, a estigmatização do condenado arrimado ao discurso abolicionista da ressocialização já não tem mais lugar na quadra da história em que vive a humanidade. O aprofundamento de conceitos acerca do humanismo, cidadania, igualdade, solidariedade, garantias individuais etc, sem dúvida, afastam definitivamente estas “teses” contrárias a ordem jurídica estabelecida pelo Estado Democrático de Direito.

Por fim, Rogério Greco, com brilhantismo, nos faz lembrar que “não podemos afastar todas as nossas conquistas que nos foram sendo dadas em doses homeopáticas ao longo dos anos, sob o falso argumento do cidadão versus inimigo, pois que, não sendo  possível conhecer o dia de amanhã, quem sabe algum louco chegue ao poder e diga que inimigo também é aquele que não aceita a teoria do Direito Penal do Inimigo, e lá estarei eu sendo preso, sem qualquer direito ou garantia, em troca de um argumento vazio e desumano”.

*Rodolpho Mendes é advogado Criminalista da equipe do escritório Rogério Leal & Advogados Associados