A conta vai sobrar para todos nós

*Gabriel Buissa

O país viveu intensos dias de crise política e econômica, ocasionadas pelo movimento paredista dos caminhoneiros em todo o território nacional. Já passado quase um mês do início da greve, a situação se normalizou nas rodovias, mas as consequências ainda vão longe. O governo federal realizou acordos com os representantes dos grevistas, que se por um lado conseguiu por fim ao movimento, por outro trará alto custo aos cofres públicos. Vejamos os reflexos do acordo.

Por um lado, temos a política de preços do combustível, instituída pela Petrobrás. Atualmente  o preço do combustível é reajustado diariamente de acordo com um cálculo envolvendo o preço do barril do petróleo internacional e a flutuação do dólar, o que garante uma política de investimento nos títulos da Estatal, pois frente ao mercado essa é uma garantia que a estatal terá bons números. Tanto é que o próprio Presidente da empresa, Pedro Parente, nos dias após o anúncio do acordo, fez reuniões com investidores para não tirarem seus investimentos. Essa política está mantida e a Petrobrás seguirá intacta após o acordo.

Por outro lado, temos impostos e contribuições que são acrescidos ao preço final do combustível ao consumidor, que são a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), o Pis e Cofins (ambos de competência da União) e o ICMS (imposto de competência estadual). E é nesta parcela do preço final do combustível que foram feitas alterações para que o governo chegasse ao acordo com os caminhoneiros.

A primeira medida foi a alíquota 0 na CIDE e no Pis\ Cofins sobre o diesel, que garantirá uma redução imediata de R$ 0,16 no preço deste combustível. É importante ressaltar que essa seria a única medida tributária que o Governo poderia fazer, afinal, o ICMS é regulado pelas Assembleias dos Estados. Assim, para reduzir as alíquotas do ICMS, o Governo somente pode articular com os Estados, o que foi feito nos últimos dias com reuniões na CONFAZ (Confederação das Políticas Financeiras), resultando já em reduções de alíquotas, como anunciado pelo Governo do Estado de Goiás. Logo, o acordo foi além, garantindo a redução imediata de R$ 0,46 no preço atual e o congelamento deste por 60 dias. Há, portanto, uma conta a se pagar de R$ 0,30 por litro de diesel vendido ao consumidor final. Essa conta final será paga com dinheiro do Tesouro Nacional e não retirado da Petrobrás, ou seja, dos litros de diesel nos próximos 60 dias, R$ 0,30 centavos será bancado pelo Governo.

Outra medida também tomada por meio de Decreto publicado na noite do último domingo, o governo reonerou 28 setores produtivos em suas folhas de pagamento, dos 56 setores anteriormente desonerados. O que isso significa? A desoneração na folha de pagamento era  uma medida tomada pelo governo em 2011 para que as empresas pudessem contratar empregados sem que isso aumentasse sua contribuição tributária, uma saída para aumentar o emprego. Antes pagava-se 20% de tributos sobre a folha de pagamento e com a desoneração, passou-se a taxar, entre 1% e 4,5%, na própria produção. Com a reoneração de metade dos setores, agora parte das empresas voltará a recolher impostos sobre sua folha de pagamento. Com isso, o governo espera arrecadar cerca de R$ 3,5 bilhões até o fim do ano, para custear parte do acordo firmado com os caminhoneiros.

Acontece que ainda assim o próprio governo prevê um déficit de cerca de R$ 10 bilhões a ser pago pela redução no preço do diesel. Ocorre que a Emenda Constitucional 95 aprovada no ano passado, a polêmica Emenda do Teto dos Gastos Públicos, veta o gasto superior à arrecadação da União. Há, portanto, uma conta que ainda não fecha.

Então, com esse excedente restará as seguintes soluções: ou o governo terá que aumentar impostos para arrecadar mais e fechar a conta, ou terá que rever ainda mais na sua renúncia fiscal, como era o caso da desoneração, ou ainda retirar investimentos de outras áreas, como saúde, educação, etc. No fim, independente da escolha, é muito provável que a população como um todo pague o acordo. Uma espécie de tapar o sol com a peneira, já que não resolve de todo o problema dos preços do combustível, estopim da greve, e da população em geral. Veremos ainda como se fecharão as contas públicas até o fim do ano.

*Gabriel Buissa é advogado