Advogado é proibido de exercer a advocacia por dois anos por exploração de prestígio e associação criminosa

Wanessa Rodrigues

Um advogado goiano foi condenado a dois anos e seis meses de reclusão por associação criminosa e exploração de prestígio no exercício da advocacia. A pena foi substituída por uma prestação pecuniária de dois salários mínimos e pela proibição de exercer a profissão por dois anos. A decisão é da juíza Placidina Pires, da 10ª Vara Criminal Goiânia. Outras cinco pessoas também foram condenadas por associação criminosa.

A decisão é da uíza Placidina Pires, da 10ª Vara Criminal de Goiânia

Ao proibir que o advogado exerça a profissão por determinado período (art. 47, inciso II, do CP), a magistrada ressaltou que ele praticou o delito de exploração de prestígio no exercício da advocacia, violando dever que lhe era inerente. “Entendo que a interdição temporária de direito, consistente em proibição do exercício da profissão, se mostra suficiente e adequada principalmente para impedir que a atividade lícita da advocacia, função essencial à Justiça, seja por ele utilizada para distorções criminosas”, observou Placidina Pires.

Conforme apurado, entre os meses de setembro 2015 e janeiro de 2016, os seis acusados associaram-se em quadrilha para, armados, cometerem infrações penais diversas em Goiânia e em Senador Canedo. Durante este período, segundo a peça acusatória, eles praticaram delitos que vão desde roubo e receptação de veículos, homicídios, coação de testemunhas, até o comércio de drogas e armas de fogo e resgate de preso em Caldas Novas. O advogado prestava assistência jurídica e também integrava efetivamente o bando criminoso.

Os crimes foram descobertos por meio de interceptações telefônicas nas quais os acusados conversam sobre a comercialização de armas de fogo e munições, inclusive uma metralhadora. Além de falarem sobre homicídios por eles praticados em concurso de agentes, como a morte de um traficante rival e de outros integrantes do grupo criminoso. O advogado é citado nas ligações.

Participação
Descobriu-se que o advogado levou um dos criminosos ao hospital depois de uma troca de tiros e, em outra ocasião, que o profissional foi informado sobre um suposto homicídio, sendo que posteriormente ele teria ameaçado uma testemunha ocular do referido delito. Além disso, que orientou um dos acusados a sumir com a arma utilizada na prática da infração penal e comentou que havia a possibilidade de um policial conhecido trocar o cano de uma pistola, certamente para que o exame de balística a ser realizado na arma de fogo desse negativo.

O profissional também teria solicitado dinheiro a pretexto de influir em assistente de juiz da comarca de Senador Canedo (assistente não identificada), alegando que tais valores também seriam destinados a esta funcionária. Ela teria cobrado R$ 2 mil para reduzir o valor da fiança arbitrada a um dos acusados preso portando uma pistola.

Ao ser interrogado na Delegacia e em juízo, o advogado negou a prática do delito e disse que a quantia solicitada por telefone, na realidade, se referia ao valor da fiança arbitrada pelo juiz e aos seus honorários advocatícios. Aduziu que requereu à servidora apenas para que agilizasse o procedimento. Contudo, em uma das ligações interceptadas, conforme aponta o Ministério Público na ação, o advogado chega a falar para um dos criminosos que a propina (pau) pode ser paga tanto na rua, para a polícia militar, na Delegacia de Polícia, como para o magistrado. Posteriormente, ele disse que pagou do próprio bolso, pois ainda poderia precisar da servidora.

A magistrada observa que, embora a servidora não tenha sido identificada e sequer ouvida a respeito da veracidade das alegações do advogado, os elementos probatórios reunidos afiguram-se aptos à comprovação de que o profissional solicitou quantia a pretexto de influir em assistente de juiz.

“Apesar de não haver nos autos comprovação de que a vantagem pecuniária solicitada pelo advogado foi efetivamente entregue à funcionária, o crime de exploração de prestígio se aperfeiçoou. Isso porque, se trata de delito formal, que se consuma com a simples solicitação de vantagem a pretexto de influir em juiz, jurado, órgão do Ministério Público, funcionário da Justiça, perito, tradutor, intérprete ou testemunha, independentemente de seu efetivo recebimento, situação que caracteriza mero exaurimento do delito”, explica a magistrada.

Homicídios
Os homicídios, a partir do resultado das interceptações telefônicas deferidas pela juíza foram investigados e os réus denunciados, estando os feitos ainda em fase de instrução processual em outros juízos (varas de crimes dolosos contra a vida), ao passo que os delitos de associação criminosa e exploração de prestígio foram apurados nesta unidade judiciária. Os réus negaram envolvimento nos fatos criminosos e alegaram a nulidade das provas produzidas.

Interceptações
Quanto à alegação de nulidade das interceptações telefônicas porque foram autorizadas a partir do acesso a um celular apreendido com um investigado em outra operação policial, a magistrada disse que, como a busca e apreensão do celular foi autorizada judicialmente, logo, lícita a devassa realizada no referido aparelho e, consequentemente, a interceptação telefônica superveniente.

Destacou, ainda, que a quebra de sigilo telefônico e a interceptação telefônica revestiram-se de inquestionável valor probatório, pois foram produzidas produzidas em estrita observância às disposições contidas na Lei nº 9.296/96. Além disso, a defesa técnica teve amplo acesso aos elementos obtidos por meio das referidas medidas, exercitando, assim, amplamente o contraditório e a ampla defesa.

O advogado alegou que seu sigilo profissional foi violado, vez que as interceptações foram realizadas quando os demais acusados lhe telefonavam para buscar assessoria jurídica. A magistrada lembrou que o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil determina, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade do escritório ou local de trabalho do advogado, de seus instrumentos de trabalho, correspondência eletrônica, telefônica e telemática.

Porém, é sabido que os direitos e garantias fundamentais não são absolutos, mas passíveis de mitigação frente a interesse público relevante, podendo a referida inviolabilidade ser afastada por meio de decreto da autoridade judiciária competente. “Desde que presentes indícios suficientes de autoria e materialidade da prática delitiva por parte do advogado, como no caso em questão”, completa.