O Poder Judiciário pode anular questões de concursos públicos?

O tema sobre anulação de questões das provas objetivas em concursos públicos não é harmônico na esfera do Poder Judiciário. Existem divergências nos julgamentos. Há juízes que rapidamente dão procedência para anulações ante a flagrante ilegalidade das questões, outros, no entanto, indeferem pedidos de anulação sob a falaciosa alegação que o Judiciário não pode “substituir” a banca examinadora.

Por conseguinte, é de grande relevância entender quais situações pode-se considerar flagrante ilegalidade das questões de concursos públicos para que o candidato recorra ao Judiciário a fim de tomar as devidas providências, pois muitos “concurseiros”, não são aprovados em uma prova por causa de um ou dois pontos, e com a anulação de poucas questões, seria possível requerer judicialmente a continuidade do candidato nas etapas seguintes do certame.

Primeiro, será possível a anulação ante a flagrante ilegalidade de questão quando há “erro material”, isto é, se é detectado um erro grosseiro, invencível e indiscutível na questão, conforme posicionamento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.

Segundo, há flagrante ilegalidade quando não há previsão no conteúdo programático do Edital sobre determinado assunto e este é cobrado em alguma questão na prova. Segue um trecho retirado de uma decisão da Suprema Corte sobre o tema: “O Supremo Tribunal Federal entende admissível o controle jurisdicional em concurso público quando não se cuida de aferir da correção dos critérios da banca examinadora, na formulação das questões ou na avaliação das respostas, mas apenas de verificar que as questões formuladas não se continham no programa do certame, dado que o edital – nele incluído o programa – é a lei do concurso”.

Logo, a banca examinadora não pode cobrar assunto não abordado no conteúdo programático do edital do concurso público, pois este é lei que deve orientar a elaboração de toda a prova, deve-se seguir os critérios de delimitação que a própria Administração Pública estabeleceu.

Um exemplo recente ocorreu na prova da Prefeitura de Goiânia para a Secretaria Municipal de Educação, no cargo de Pedagogo, onde no conteúdo programático foi estabelecido o conteúdo referente apenas a Geografia, História e Conhecimentos Gerais sobre Goiânia e Goiás, e na prova objetiva a banca examinadora arbitrariamente cobrou questões que tratavam de Conhecimentos Gerais do Brasil. Eis uma flagrante ilegalidade! Logo, não ocorreu compatibilidade entre o conteúdo da questão e o edital! Por isso, neste caso, é possível o controle jurisdicional para evitar situações de ilegalidade.

Afinal, é uma injustiça cobrar do candidato conteúdo além do edital. A Administração Pública tem que obedecer os princípios constitucionais como legalidade, segurança jurídica, vinculação ao edital, para gerar previsibilidade, confiança e credibilidade no processo seletivo que visa o ingresso de servidores públicos aos cargos públicos.

É importante ressaltar que a não intervenção do Judiciário quando se verifica claramente uma ilegalidade em questões, fere diretamente o princípio constitucional insculpido no artigo 5º da nossa Constituição Federal, no seu inciso XXXV, qual seja, “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

O ideal seria que a própria banca examinadora anulasse as questões quando se verificar situações de flagrante ilegalidade. Ocorre que, na prática, para a banca não perder sua credibilidade ao se anular várias questões, a mesma permanece na inércia prejudicando vários candidatos que foram injustiçados por tal arbitrariedade.

Por isso, resta apenas ao candidato recorrer ao Judiciário para ter a sua lesão sanada, conforme o princípio da inafastabilidade da jurisdição, no qual o juiz tem o dever de apreciar a ilegalidade aplicando a justiça no caso concreto. Logo, excepcionalmente, é possível o controle judicial das questões relativas a concursos públicos.

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